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Roberto Acioli de Oliveira

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26 de out. de 2010

O Cinema de Fassbinder e o Medo da Solidão



“Posso
dormir
quando

estiver
morto”

Segundo o ator Harry Baer,
esta foi a filosofia do hiperativo
Rainer Werner Fassbinder (1)




Amadurecendo na Alemanha Ocidental

Peter mora com os pais, mas está construindo uma casa para eles. Os três moram num apartamento anexo a um bar de propriedade do pai. Peter volta da obra e sua mãe o repreende por estar com as unhas sujas, então ele tem um flashback onde se lembra de quando era criança e seus pais estavam decidindo quem ia bater nele por ter roubado um buquê de flores para ela - a mãe bate nele com um cabide até quebrar (imagens acima e abaixo, à direita); no fim dessa lembrança, vemos num flash rápido ele atingindo um homem pelas costas furiosamente. Quando a casa deles fica pronta, não reconhecem o esforço do filho. Casando-se e mudando de cidade acredita que pode “começar de novo” - numa vã tentativa de escapar do abismo que Peter ainda não compreendeu que está dentro dele. Mas sua esposa lhe oferece tanto amor quanto os pais dele. Seguindo padrão de comportamento, para Erika, a esposa, Peter dá roupas, jóias e compra uma mobília que não tinha condições financeiras para adquirir. Quando descobre que o oficial de justiça virá recuperar a mobília, ele pergunta melancolicamente: “O que eu devo fazer? Eu só quero que vocês me amem”. Peter tenta ganhar mais dinheiro fazendo horas extras.




Peter ilustra o tema

clássico de alguém que
reproduz a opressão
da qual foi vítima






Erika o estimula a pedir dinheiro emprestado aos pais, mas ele não consegue. Arruma um segundo emprego e cai em profunda depressão. Chega a comprar uma arma e planeja um assalto. Vê uma chance no apartamento da avó de sua esposa, mas recua. Vai à cervejaria do prédio da velha senhora e fica esperando o momento certo. O dono é anti-semita e intolerante com a juventude. O homem começa a brigar com um rapaz que pede cerveja depois que o bar fechou, chamando-o de parasita e preguiçoso. Subitamente, toda a exploração que Peter absorveu passivamente durante sua vida se transforma em fúria e atinge violentamente o dono do bar com o telefone – talvez Peter tenha considerado a oportunidade para um assalto, mas o homem era fisicamente muito parecido com seu pai. Tendo sido descoberto no ato, Peter chora e chama pela mãe - quase sem conseguir pronunciar a palavra “mãe”. Sentenciado a dez anos de prisão, durante o acompanhamento psiquiátrico Peter revela que seu pai dizia que o filho não tinha futuro. A doutora pergunta: “Você está feliz por estar vivo?” Peter hesita com seu olhar perdido e se retira (2).

Sentimentos São Para Vender

Fassbinder dizia que
gostava de colocar seus
amigos em cena nos seus
filmes
. Seria essa a razão
de dar personagens para
sua mãe
. Podemos dizer
que ele contracena com
a ausência de seu pai?



Eu Quero Apenas que Vocês me Amem
(Ich will doch nur, dass ihr mich liebt, 1975) foi realizado entre dois filmes políticos de Rainer Werner Fassbinder, Mamãe Kusters Vai ao Céu (Mutter Küsters Fahrt zum Himmel, 1975) e A Terceira Geração (Die Dritte Generation, 1979). O filme em questão foi rodado numa passa das filmagens de O Assado de Satã (Satansbraten, 1975), juntos eles podem ser interpretados como o auto-retrato de um artista em crise, projetando versões extremas de lados opostos de si. Vistos juntos, Eu Quero Apenas que Vocês me Amem e O Assado de Satã exploram a personalidade bipolar de Fassbinder, como, aliás, ele já havia se mostrado em Cuidado Com a Puta Sagrada (Warnung vor einer heilingen Nutte, 1970), onde poderia ser identificado com personagem principal, ao mesmo tempo maltratado e explorador. Se em O Assado de Satã Fassbinder se identificou a um personagem sem escrúpulos, em Eu Quero Apenas que Vocês me Amem o personagem central é vulnerável, maltratado e explorado. Foi apenas um impulso irracional que o levou a atingir e matar alguém que momentaneamente simbolizava a opressão dos pais. O filme é baseado no caso real de um jovem preso por assassinato. Houve também suspeitas de que Fassbinder tenha plagiado uma peça veiculada pela televisão alemã na época (3). (Imagem acima, à esquerda, Peter após receber dinheiro do pai e disfarça diante da mãe, que chega na bem na hora; abaixo, à direita Peter com Erika, o casal está falido e ela havia insistido para que Peter pedisse dinheiro aos pais; ele não conseguiu fazê-lo, mas por sorte recebeu algum dinheiro)




Nessa época,
Fassbinder enfrentava
uma profunda crise de identidade
(4)






Wallace Steadman Watson ressalta que Peter tem muito em comum com Hanns Epp, de O Mercador das Quatro Estações (Der Händler der vier Jahreszeiten, 1971). Hanns também se sente rejeitado por seus pais aburguesados, arruma um emprego de classe operária e se deprime cada vez mais, na medida em que internaliza os insultos dirigidos a ele. Ao contrário de Hanns, Peter não morre no final – pelo menos tecnicamente, ele continua vivo! Supondo que, como sugere Watson, uma interpretação de Eu Quero Apenas que Vocês me Amem como uma obra autobiográfica seja possível ou razoável, então quando tomada em conjunto com O Assado de Satã, a saga de Peter poderia ser vista como uma projeção imaginária do lado vulnerável da personalidade de Fassbinder. O filme poderia ser uma fantasia de Fassbinder a respeito de sua infância problemática, na qual a ausência de atenção dos pais é interpretada como maus tratos e exploração sistemática. Além disso, a ausência do pai teria assumido a forma de um dono de cervejaria maltratando um jovem com jaqueta de couro – um pai substituto que a criança vitimada tem que matar; Eu Quero Apenas que Vocês me Amem inaugura a presença dos duplos na obra de Fassbinder, o homem da cervejaria é uma cópia do pai de Peter. Yann Lardeau também inclui este filme entre aqueles do cineasta que carregam uma referência religiosa - a história do calvário de Peter. O repúdio de seus pais, a falta de confiança, autoconfiança e amor levam Peter a tentar roubar e acabar matando. Porém afirma Lardeau, esse desejo de morte é menos direcionado aos outros do que a ele mesmo. Uma autodestruição indireta, pois, mesmo na revolta, dar razão as opiniões negativas de seus pais sobre ele e seu futuro de pessoa inútil (5).




Muitas v
ezes, nos filmes de
Fassbinder
, as explicações médicas
ou ideológicas de um comportamento como o de
Peter aparecem como um signo da insuficiência delas (6)





Watson também se refere a outra interpretação corrente para a hipótese autobiográfica. Haveria uma conexão entre o hábito de Peter dar muitos presentes como sua maneira de comprar amor – construir uma casa para seus pais, comprar flores e mobília para a esposa – e a inclinação do próprio Fassbinder adulto de comprar presentes caros para seus amantes e pagar a conta de refeições caras e viagens para seus amigos. Contudo, de acordo com Juliane Lorenz, apesar dele “realmente gostar de dar presentes”, essa não seria para ele uma forma neurótica de ganhar amor. Numa entrevista em 1975, Fassbinder contou que Peter é um “homem servil” (capacho, lacaio) que aprendeu cedo através de seus pais que “sentimentos são para vender” – seja diretamente através de presentes ou conformando-se as expectativas dos outros. Ele afirmou que Eu Quero Apenas que Vocês me Amem foi um projeto muito pessoal, concebido como forma de auto-exame após a experiência no comando do grupo teatral (uma espécie de família) do Teatro na Torre (Theater am Turm, TAT). Fassbinder disse que pretendia fazer um filme como um meio de considerar “no que eu tenho me deixado entrar até agora” (7).


A reflexão sobre sentimentos
permitiu a Fassbinder trabalhar

diferentes temas
. No caso deste filme,
criminalidade entre os jovens. Na cela
de Peter na prisão
existe um móbile
com três mãos
. Cada uma aponta
numa direção diferente
(8)




Robert Katz e Peter Berling adicionam mais um elemento problemático quando afirma que Fassbinder tinha fascínio pelo que chamava de “a beleza do sofrimento”. O sado-masoquismo está presente na vida e nas obras do cineasta, em vários de seus filmes ele põe em prática o mecanismo de dupla sujeição (double bind) que leva tantas relações afetivas a uma rua sem saída. Katz e Berling nos lembram que em Eu Quero Apenas que Vocês me Amem e Roleta Chinesa (Chinesisches Roulette, 1976), a falta de amor dos pais gera violência. Juntamente com Cuidado com a Puta Sagrada (onde um cineasta é ao mesmo tempo implacável e frágil), O Assado de Satã (onde protagonista leva uma surra e descobre que sente prazer com a dor) nos dá um auto-retrato de Fassbinder onde, como ele mesmo declarou, “tentei fazer uma comédia sobre mim mesmo; observando, de certa distância, o meu lado negativo; é uma comédia sobre como eu talvez seja, se bem que não creia que seja assim”. De acordo com Katz e Berling, os “talvez” e “não creio” ficam por conta da malícia do cineasta. Harry Baer, amigo de Fassbinder, tendo atuado em muitos de seus filmes, o processo de trabalho dele era muito complexo. Pesadelos infantis e juvenis pela falta de afeto, solidão, medo de contato com as pessoas e puberdade não vencida, tudo isso embaralhado com imagens de filmes noir e filmes B norte-americanos e franceses, além de filmes alemães antigos. Cinema como compensação da vida, concluiu Baer (9). (as duas imagens abaixo, Peter, Erika e as flores)

Circuitos Instáveis de Troca



Tanto a mãe de
Peter quanto
sua
esposa só reclamam
e são incapazes
de dar amor





Harry Baer explicou que com seus primeiros filmes Fassbinder não consegue libertar-se das suas visões, continua sempre abrindo velhas feridas e atormenta e si mesmo e a sua mãe que, de acordo com Baer, suporta a tortura com incrível paciência. O ator cita um filme do cineasta, Deuses da Peste (Götter der Pest, 1969), com um forte caráter sado-masoquista. Numa cena onde seu personagem sai da prisão, minha mãe (a mãe de Fassbinder atua no papel sob o pseudônimo do Lilo Pempeit) meio confusa apenas balbucia “meu filho!”. Ela se apóia em meu irmão e, totalmente insegura, coloca um disco com uma canção revolucionária também não muito própria para a ocasião. Baer se perguntou então do que Fassbinder estaria tentando vingar-se (10). Neste filme Rainer Werner Fassbinder explora, entre outras coisas, a instabilidade inerente ao paradoxo das obrigações: dar e receber, receber e trocar. Circuitos instáveis de troca. Instabilidade cujo equilíbrio reclama uma mudança de registro: seja a troca simbólica entre a arte e a ilusão, ou entre a moeda emocional do sexo e a da violência (sadomasoquismo?), ou mesmo entre o amor e o terror psíquico ou, ainda, um luxuoso estilo de vida que a qualquer momento pode desmoronar.



Quando criança
, Peter internalizou a insistência
de seus pais para que ele constantemente provasse
ser u
m “bom garoto”





Como lembrou Thomas Elsaesser, se pudéssemos trazer dois títulos de filmes de Fassbinder que evidenciam o desequilíbrio entre os diferentes circuitos postos em tensão durante as trocas, poderíamos citar Eu Quero Apenas que Vocês me Amem e O Amor é Mais Frio do que a Morte (Liebe ist kälter als der Tod, 1969). Dois filmes, Elsaesser sugere, que ligam os dois pólos aos quais se articula a vida de Fassbinder e sua atividade de cineasta. O tema da opressão, tanto dos homens em relação às mulheres quanto delas em relação a eles, é recorrente na obra de Fassbinder. Ainda de acordo com Elsaesser, tanto Peter quanto Franz Biberkopf, personagem de A Encruzilhada das Bestas Humanas (Wildwechsel, 1972), compartilham um mesmo ódio as mulheres. A mãe e a esposa de Peter reclamam o tempo todo e se mostram incapazes de amar, esta é uma configuração que Fassbinder retomará em todos os seus filmes a partir de O Mercador das Quatro Estações. Na opinião de Elsaesser, o didatismo e clareza de Eu Quero Apenas que Vocês me Amem lembra outro filme de Fassbinder, O Medo do Medo (Angst vor der Angst, 1975) (11).

Lar Doce Lar




Eu Quero
Apenas que Vocês me
Amem
é a história de
um parricídio






“Eu sou meu próprio pai”, Fassbinder gostava de dizer enquanto rejeitava a família nuclear. Sua mãe, Liselotte Eder, disse que não saberia dizer quais as relações entre o cineasta e o pai dele, mas chama atenção para o fato de que em todos os filmes que o filho dirigiu cujo roteiro havia sido escrito também por ele, não existe pai. A única exceção, justamente Eu Quero Apenas que Vocês me Amem, é um parricídio disfarçado. Liselotte conta a história que ainda não sabemos. Ela se casou com o pai de Fassbinder em 1944. Em plena guerra, ele só passou a viver com ela a partir de 1945, já que ele era médico do exército alemão. Entretanto, nesse mesmo momento chegou toda a família dela, o pai, a mãe, irmãos e irmãs – a Alemanha estava destruída após a guerra e não havia moradia para todos. Com tantos vivendo entulhados num apartamento muito pequeno, sensíveis e emotivos em razão da situação familiar e do país, o casamento estava fadado ao fracasso – nascido em 1946, Fassbinder cresceu nesse ambiente (12). A família de Maria, que Fassbinder enfiou num apartamento semi destruído em O Casamento de Maria Braun (Die Ehe der Maria Braun, 1978), lembra essa situação. Por outro lado, renegar a família não significa que o cineasta não fale sobre ela. Na verdade, diria Lardeau, ao contrário de seus conterrâneos, os cineastas Werner Herzog e Wim Wenders, a família humana acaba sendo o tema do cinema de Fassbinder (13).




O vestido da doutora
que atende a Peter
na prisão tem uma
estampa com flores






Apesar de viver com aquele monte de gente, era pequeno demais para saber quem era quem. Contou também que estabelecera uma relação de amizade com a mãe e por isso a fez trabalhar com personagem de seus filmes. O melhor, ele sempre colocava seus amigos trabalhando em seus filmes. Quando meus pais se divorciaram em 1951, conta Fassbinder, ele tinha seis anos. Então ele passou da família enorme espremida num apartamento para a solidão compartilhada com a mãe. De acordo com Yann Lardeau, essa solidão foi a tela de fundo de Eu Quero Apenas que Vocês me Amem. O filme começa com o flashback onde um Peter ainda criança leva uma surra da mãe por haver roubado flores da vizinha para oferecer a ela. Estas flores tornam-se o tema central (leitmotiv) do filme. Peter sempre oferece flores quando chega do trabalho. Até o papel de parede do apartamento onde morava com os pais tem flores. Elas se tornam, sugere Lardeau, a linguagem do amor ausente, do amor recusado. O tema das flores vem da história pessoal de Fassbinder. Sua mãe disse lembrar-se da generosidade de um garoto que pega seu dinheirinho e compra flores para a mãe e a avó. Ao passo que o cineasta disse lembrar-se de uma série de tentativas infrutíferas para comprar o amor de uma família fria e aburguesada (14). (nas duas imagens acima, Peter durante a entrevista com a terapeuta na prisão; a última imagem mostra Peter em sua sela)





Você não sabe
o que é estar só
. Você
não sabe nada!






Por duas vezes Peter diz a Erika que uma mulher não deve deixar seu filho sozinho. Esta foi a razão que ele deu a esposa para que ela parasse de trabalhar para cuidar do filho recém nascido, mesmo o casal estando sem dinheiro. Esta frase parece encontrar um eco na infância de Fassbinder, uma espécie de medo da solidão. Em 1982, Fassbinder passou dez dias com Dieter Schidor em Cannes. Chegou uma hora que Schidor pediu para ter uma noite de sono – Fassbinder vivia de noite. Às duas horas da madrugada, o cineasta começa a bater insistentemente na porta de Schidor - que tentou tapar os ouvidos com o travesseiro - até que os hóspedes nos outros quartos começaram a reclamar. Schidor se rendeu, abriu a porta e Fassbinder exclamou: “Você não tem idéia do que é ficar sozinho, você não tem idéia, você não sabe de nada!” (15).

Notas:

Leia também:
O Desespero de Fassbinder
Fassbinder e Hollywood
Fassbinder: Anarquista Romântico
As Personas de Ingmar Bergman
O Rosto no Cinema (VI)
Herzog, Fassbinder e Seus Heróis Desesperados
As Mulheres de François Truffaut (I)
Algumas Mulheres de Fellini em A Doce Vida e Amarcord
Tarkovski Através do Espelho
Buñuel e as Formigas
Pier Paolo Pasolini: É Intolerável Ser Tolerado
Antonioni e o Grito Primal
Luchino Visconti, Rocco e Seus Irmãos
Antonioni e a Trilogia da Incomunicabilidade (I), (II), (III), (IV), (V)
Yasuzo Masumura e os Olhos nos Dedos

1. BAER, Harry. A Vida Sufocante de Fassbinder. “Posso Dormir Quando Estiver Morto”. Tradução Márcio Suzuki. São Paulo: Brasiliense, 1985. P. 21.
2. WATSON, Wallace Steadman. Understanding Rainer Werner Fassbinder: Film as Private and Public Art. USA: University of South Carolina Press, 1996. P. 166.
3. Idem, pp. 164-5.
4. Ibidem, p. 154.
5. LARDEAU, Yann. Rainer Werner Fassbinder. Paris: Éditions de l'Étoile/Cahiers du Cinéma, 1990. Pp. 82, 106 e 111.
6. ELSAESSER, Thomas. R.W. Fassbinder. Un Cinéaste D’allemagne. Paris: Éditions du Centre Pompidou, 2005. P. 50.
7. WATSON, Wallace Steadman. Op. Cit., pp. 166 e 187n62.
8. ELSAESSER, Thomas. Op. Cit., p. 74.
9. KATZ, Robert; BERLING, Peter. O Amor é Mais Frio do que a Morte. A Vida e o Tempo de Rainer Werner Fassbinder. Tradução Carlos Sussekind. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992. P. 122.
10. BAER, Harry. Op. Cit., p. 22.
11. ELSAESSER, Thomas. Op. Cit., pp. 394 e 458.
12. LARDEAU, Yann. O. Cit., p. 18.
13. Idem, p. 247.
14. Ibidem, p. 20.
15. Ibidem.

4 de out. de 2010

As Mulheres de Rainer Werner Fassbinder (XI)

Roleta Chinesa



Fantasia de vingança

de uma adolescente, mas
também an
álise/ataque de Fassbinder ao casamento e
a
outros laços emocionais
entre   os   adultos (1)


 

Amadurecendo na Alemanha Ocidental

Angela Christ é uma menina precoce, reservada e paralítica e incomodada, pois acredita haver ressentimento dos pais em relação a confusão que o problema físico dela teria causado na vida deles. Angela acredita que esse ressentimento foi o motivo que levou aos casos extraconjugais de Gerhard Christ, seu pai, e Ariane Christ, sua mãe. Para se vingar, ela dá um jeito de que os dois se encontrem quando estiverem juntos, cada qual com o/a respectivo/a amante – Kolbe é o amante de Ariane, Irena é a amante de Gerhard. Assim, todos se encontram “casualmente” na residência de campo da família. Depois de um choque inicial, os dois casais relaxam e não questionam os amantes um do outro. Angela chega inesperadamente, com suas muletas, a coleção de bonecas e Traunitz, sua governanta muda. A menina logo põe em marcha sua vingança, culminando com a Roleta Chinesa. Um jogo da verdade, dois grupos fazem perguntas um ao outro, seu objetivo é descobrir o nome da pessoa de seu próprio grupo escolhida pelo grupo oponente. O objetivo principal de Angela é atingir a mãe, que mal conseguia disfarçar seu ódio pela filha aparentemente, apenas pelo fato da filha haver armado aquela situação. Mas só será possível perceber isso no final do jogo, pois a maioria das respostas do grupo de Angela se aplicaria aos componentes do grupo da mãe.



“Neste filme

as mulheres são
mais fortes do

que os homens”

Rainer Werner
Fassbinder (2)





As respostas da governanta acompanhante da menina são insultos, as de Angela são perversas. Então o pai diz que falta “uma famosa pergunta”, dando a entender que deveria ser muito popular no país onde Adolf Hitler subiu ao poder pelo voto. Quando pergunta que função a pessoa teria tido durante o Terceiro Reich, Angela responde: “comandante em Bergen-Belsen” (um campo de concentração Nazista). A Sra. Kast, criada da casa (que vinha suportando os insultos de Angela), sugere que seja ela a pessoa a quem o grupo da menina se refere. Mas Angela se adianta com uma alegria diabólica: “Errado. Ela é a mais inofensiva. É você mamãe”. A mãe aponta uma arma para Angela (e já havia apontado antes), mas dispara no pescoço da governanta muda, que parecia estar encorajando o ódio da menina pela mãe. Na cena final uma procissão passa na frente da casa, ouvimos um tiro e começa uma música religiosa orando à Virgem Maria por misericórdia “neste vale de lágrimas”. Enquanto isso aparece na tela palavras pronunciadas nas cerimônias de casamento: “está disposto a se casar e permanecer fiéis um ao outro até que a morte os separe?”

Crianças, Famílias e Cinema Alemão




Em seus filmes, Truffaut
teria chegado a um acordo com
sua infânc
ia arruinada, Fassbinder
disse que em seu caso não se trata
de infância arruinad
a, apenas
ela   nunca   existiu
(3)




A fase final e mais complexa da trajetória do cineasta alemão Rainer Werner Fassbinder começa em 1975, um período de crise tanto em seu trabalho quanto em sua vida privada. Roleta Chinesa (Chinesisches Roulette, 1976) figura entre os filmes desta fase e explora a opressão psicológica das crianças e a revanche delas contra os pais. Juntamente com Eu Só Quero que Vocês Me Amem (Ich will doch nur, dass ihr mich liebt, 1976), onde Peter, um filho, se vinga de seu pai opressor, os dois filmes abordam questões de convivência familiar e problemas de relacionamento. Antes, em O Mercador das Quatro Estações (Der Händler der vier Jahreszeiten, 1971), já podemos encontrar Renate, uma filha pequena as voltas com seus pais confusos – papel de Andrea Schober, a mesma atriz mirim que atuará como Angela em Roleta Chinesa anos depois. Effi Briest (Fontane Effi Briest, 1973), adaptação do livro homônimo de Theodor Fontane (1819-1898) nos apresenta Effi, a filha que nutre um ciúme profundo em relação a sua mãe, alimentado pelos casos extraconjugais desta – e que também tem uma filha pequena, Annie (Andrea Schober). Em Medo do Medo (Angst vor den Angst, 1975) Margot tem uma filha pequena, Bibi. Mas isso não a impede de ter como amante Dr. Merck, o farmacêutico – ele fornecia receitas de Valium. As filmagens de Roleta Chinesa tiveram início apenas quatro meses após a conclusão do filme sobre o filho que finalmente se vingou. Ao contrário do filme anterior, a vingança de Angela não é física, mas psicológica. Friamente calculada, a vingança não se transforma numa explosão de ódio cego – pelo menos por parte da menina, o que não podemos dizer em relação à mãe (4).



Fassbinder esclareceu
que ausência de crianças
em seus filmes não implica
que as suas experiên
cias de infância  não estivessem
presentes em sua obra (5)



Escrevendo em 1989, portanto falando de um cinema alemão de antes da queda do Muro de Berlin, Thomas Elsaesser afirma como característica do Cinema Novo alemão obras voltadas a questionamentos de ordem existencial. Quando se pensa, sugere Elsaesser, nas imagens apocalípticas em Werner Herzog, nas lamentações de Hans-Jürgens Syberberg, nos filmes melancólicos de Wim Wenders e na autoflagelação de Fassbinder, poderíamos nos perguntar se o sentido que fazem de uma infância perdida é a expressão de um “mito das origens” ou outra forma de reprimi-lo e afastá-lo. As cicatrizes da infância (em termos existenciais, como um mal-estar geral e uma sensibilidade depressiva), como aparecem nos personagens adultos da primeira fase de Fassbinder (como o protagonista de O Mercador das Quatro Estações), ou de Herzog (com seu Kaspar de O Enigma de Kaspar Hauser, Jeder für sich und Gott gegen alle, 1974), ou ainda de Wenders (os amigos de No Decurso do Tempo, Im Lauf der Zeit, 1976), sugerem enigmas e traumas dos quais os filmes são soldagens preliminares desfocadas, deixando os espectadores tão desconsolados quanto os personagens. Então Elsaesser conclui, apenas quando o olhar é direcionado para trás e para o interior, quando uma suspensão do tempo e do espaço duplica a percepção, a infância se torna um sujeito cinematográfico viável para o cinema alemão. Elsaesser contrapõe este tipo de cinema e o de cineastas como Ulrich Edel, cujo Christiane F (Christiane F. - Wir Kinder vom Bahnhof Zoo, 1981), filme sobre o abuso de drogas por adolescentes, parece endereçado apenas à compreensão de assistentes sociais.




Em toda a obra 
de Fassbinder a família
sempre foi problemática, 
com várias esposas e mães
castradoras e poucos pais
e figuras p
aternas (6)




Herzog e Fassbinder foram criados por mães abandonadas pelos maridos. Todavia o fato de, apesar dos diferentes estilos de direção e narrativas, o trabalho deles parece unificado por elementos essenciais, sugere que as permutações representem diferentes estratégias em resposta uma crise que tem em comum. O que em Herzog é revolta contra o pai, aparece em Fassbinder como submissão castradora. Ao passo que no cinema de Margareth von Trotta o resultado de rivalidade edipiana entre irmãs implica violência contra si ou loucura. Em O Equilíbrio da Felicidade (Schwestern oder die Balance des Glücks, 1979), uma mãe sozinha tem de criar as filhas. Traumatizada com a situação, ela percebe que naquela Alemanha do pós-guerra uma mulher teria que pensar e agir como homem para sobreviver – com tudo que uma criação com pai ausente implica. Maria, uma das filhas, tenta agir como uma figura paterna para Anna a partir de um padrão/clichê: um pai severo, sempre certo, um modelo de determinação. A tendência suicida de Anna, a depressão da mae, e a eficiência funcional de Maria espelham uma a outra e formam uma fortaleza vazia, cimentada com culpa e recriminação e cuja interdependência mútua não pode ser penetrada. A mae se destrói antes mesmo das filhas cometerem suicídio. Em Os Anos de Chumbo (Die Bleierne Zeit, 1981), o pai é um pastor e existe, mas é um ausente. Marianne é diferente de Anna, pois dirige sua violência para os outros, ao invés de si mesma. Ela se junta a uma organização terrorista, enquanto sua irmã Juliane, uma jornalista, cuida dela na prisão.



A figura paterna perdeu
espaço na sociedade industrial.
Mas na Alemanha houve agravantes
:
a adesão ativa ou passiva ao N
azismo,
os que não voltaram da guerra e os
que
,   prisioneiros,   voltaram
muito   tempo   depois (7)



No cinema de Wenders o conflito edipiano direto parece ser deslocado, ele ressurge na busca ao nível da narrativa de um camarada ou um duplo, e por uma relação emocionalmente muito carregada dos protagonistas com meios de comunicação e representação que lhes asseguram uma identidade pessoal – como os interesses em comum em relação à música, à literatura e ao cinema dos amigos de No Decurso do Tempo. Apesar da falta de crianças nos filmes de Fassbinder, não se pode dizer que ele tenha evitado totalmente a questão, já que mulheres povoam muitos de seus filmes - a começar pela presença de sua mãe como personagem em diversos deles (8). Por outro lado, poucas dessas personagens são mães. Com relação à figura paterna, temos o relato de sua mãe: “Eu não posso lhes dizer qual era a relação de Rainer com o pai. O que sei é que, em todos os filmes onde o roteiro foi escrito por [ele], não existe pai”. Ou, como resumiu o próprio Fassbinder: “Eu sou meu próprio pai” (9).

Temas Nem um Pouco Secundários 




Laços  emocionais
retomados tarde demais
, frustração,     machismo,
preconce
ito   de   classe,
anarquismo, plágio






Wallace Steadman Watson chama atenção para o fato de que Roleta Chinesa não trate apenas da vingança de uma menina, também é uma análise complexa do casamento e outros laços emocionais entre adultos. Ironicamente, os pais de Angela se aproximam mais durante o fim de semana de confinamento na casa de campo. Gerhard chega a declarar seu amor por Ariane em dois momentos tensos, antes dela quase atirar na filha e depois do tiro em Traunitz. O filme também explora as relações entre os dois homens e as duas mulheres. Como Fassbinder declarou, “neste filme as mulheres são mais fortes do que os homens”. Ariane e Irena conseguem expressar admiração uma pela outra, ao contrário dos homens, que tendem a se portar como adolescentes rivais. Roleta Chinesa também aborda temas sociais e políticos mais amplos além do drama psicológico. Uma crítica das diferenças socioeconômicas de classe se materializa em Kast, a criada, e seu amargurado filho Gabriel, um escritor frustrado trabalhando como faz-tudo – recitando um trecho de seu livro nunca publicado, entre outras coisas ele prega o anarquismo. No início do filme, a Sra. Kast passa de carro e Gabriel está vindo no cruzamento em sua direção. Sem saber que se trata do filho, ao ouvir o outro carro dar uma freada ela reclama e o chama de fascista. A Sra. Kast está se referindo ao motorista do carro que quase bateu nela? A seu filho (se é que ela o viu ao volante)? Ao Sr. Gerhard que chegou de surpresa na mansão ou ao fabricante do carro que quase bateu nela? – a fábrica BMW foi uma das tantas indústrias alemãs que se adaptaram muito bem ao regime de Adolf Hitler; logo a seguir ao comentário da Sra. Kast, o espectador fica de frente para o emblema da BMW no capô do carro do Sr. Gerhard, que Gabriel está dirigindo. Durante o jantar Ariane se lembra que a ópera Tristão e Isolda está sendo apresentada – uma referência ao amor impossível... Por fim, numa referência um tanto vaga, Gerhard comenta com a Sra. Kast sobre o assassinato de um “Ali Ben Basset” em Paris – na opinião de Watson, isso sugere envolvimento nalguma intriga política.


Fassbinder
colocava tudo nos
filmes
, até mesmo um
personagem plagiador.
Seria ou não um
mea culpa”?


No final de Roleta Chinesa, Angela está descendo a escada quando cruza com Gabriel e ameaça revelar que o manuscrito dele é um plágio. A cena poderia ser uma citação da polêmica em torno do roteiro de Martha (1973). Fassbinder havia sido acusado de plagiar o conto de Cornell Woolrich, Pelo Resto de Sua Vida (For the Rest of Her Life). O cineasta disse que imaginou uma estória que já existia, mas Cornell processou Fassbinder (10). Quando lhe mostraram as coincidências Fassbinder fiou admirado, mas insistiu que o roteiro saíra exclusivamente de sua cabeça. Aliás, Eu Só Quero que Vocês me Amem também teria sido plágio de uma peça criada para televisão alguns anos antes (11). De acordo com Harry Baer, antigo colaborador e amigo de Fassbinder, o cineasta tinha uma memória poderosa, mas ela poderia tê-lo traído. Baer cita uma precedente num caso de 1904. Siegfried Jacobson fora acusado de plágio, durante o processo descobriu uma particularidade de sua memória: conseguia armazenar passagens inteiras de livros, que podiam ser evocadas a mais leve associação (12). Em O Assado de Satã (Satansbraten, 1976), lançado no mesmo ano de Roleta Chinesa, gira em torno de um plagiador.

A Menina é Um Anjo

Roleta Chinesa
é uma variaçã
o de
Whity
  (1971)  e  uma
espécie de primo distante

de O Anjo Exterminador (1962), de Buñuel, e Salò
ou os 120  Dias  de
Sodoma
(1975)
,
de Pasolini
(13)


Para Yann Lardeau existe um angelismo na obra de Fassbinder, que de resto é marcada por referências religiosas – especialmente católicas. A presença de dois anjos em Berlin Alexanderplatz (1980), por outro lado, tem relação com o angelismo do próprio Alfred Döblin, cujo romance homônimo foi a base da adaptação de Fassbinder. A menina de Roleta Chinesa se chama, justamente, Angela. O único homem com quem ela troca algum afeto (queria até saber se ele dormiria com ela), o faz-tudo da casa, chama-se Gabriel – logo no início do filme ele pergunta ao frentista se já esteve no inferno; mais adiante, ao recitar mais um trecho de seu livro nunca publicado ele fala de homem-Deus e Deus-homen. A beleza do anjo, Lardeau sugere, emana de sua auto-suficiência, de um corpo fechado sobre si mesmo que excluindo os outros lhe abre para o nada. Esse fechamento o coloca acima dos homens ao mesmo tempo em que os exclui, torna-se um universo em si mesmo irradiando sua completude. Por esse motivo, conclui Lardeau, o anjo está em parte ligado à morte. Se o anjo pode conceder um alívio para a alma cambaleante de Franz Biberkopf em Berlin Alexanderplatz é porque a alma dele está repleta de pedaços dos cadáveres da guerra e da carnificina do Nazismo. Mas essa concessão do anjo parece mais uma prova final do que uma redenção. Biberkopf deve pagar por sua cegueira diante do Nazismo, ele se torna uma sombra, um morto-vivo. A imagem assustadora e condenada de um ser exterminado: o homem. Esta é a questão que Angela revive durante o jogo da verdade quando diz que a pessoa que todos querem descobrir (sua mãe) teria comandado um campo de extermínio durante a guerra – detalhe talvez relevante seja o fato de que Adolf Hitler começou o que chamava de “limpeza do sangue alemão” exterminando os deficientes mentais e aleijados. Quando chega à mansão, Angela precisa estar cercada por suas bonecas, que estão na mala do carro como numa tumba violada (14).



O sobrenome de Angela
é Cristo
. Sugerir a família disfuncional   dela   como
uma Santíssima Trindade
talvez tenha sido a maior
blasfêmia de Fassbinder



 
Eu Só Quero que Vocês Me Amem, A Terceira Geração (Die Dritte Generation, 1979), Roleta Chinesa e A Encruzilhada das Bestas Humanas (Wildwechsel, 1972), que trazem à cena a morte dos pais, apresentam também o rosto de criança do anjo exterminador. Esta é a opinião de Lardeau, que chama atenção para o papel de Hanni, a garota de 14 anos do último filme. Ela namora Franz Biberkopf (Fassbinder repete muitos nomes em seus filmes, este reaparecerá em Berlin Alexanderplatz), um rapaz de 19 anos que trabalha num abatedouro de frangos (abatedouros ressurgem aqui e ali na obra do cineasta) e usa um crucifixo no pescoço. O pai dela vive reclamando que perdeu a juventude durante o regime Nazista, é meio facistóide e chega a tentar abusar sexualmente da filha. A mãe dela é complacente e passiva. Os três moram num pequeno apartamento cheio de imagens de Cristo, da Virgem Maria e um grande crucifixo na parede. O pai é contra a relação da filha com Franz e o denuncia por sedução de menores, depois de solto ele volta para Hanni. A garota induz Franz a matar o pai dela e durante o julgamento friamente avisa ao rapaz que o filho que ela esperava dele morreu ao nascer e que ela nunca o amou verdadeiramente - Franz é mais um dos vulneráveis protagonistas masculinos de Fassbinder prejudicado pelas mulheres (15). Em A Terceira Geração, Fassbinder mostra o que considera jovens que nada mais sabem dos verdadeiros ideais revolucionários dos fundadores do movimento terrorista alemão Baader Meinhof, e agora se entregam à matança pura e simples – exterminadores sem causa! São justamente esses jovens que, agindo sem uma verdadeira motivação, utopia ou desespero, serão manipulados e usados (serão devorados...) por aqueles contra quem deveriam se insurgir (16).



Suicídios e uma relação

problemática com a autoridade
apontam para a família
, nos filmes
de Fassbinder e von Trotta, como
chave para as relações sociais e
a história da Alemanha
(17)




O católico Franz Xaver Kroetz, autor da peça que Fassbinder adaptou para criar A Encruzilhada das Bestas Humanas, sentiu-se ultrajado pelas mudanças feitas pelo cineasta: notadamente o close do pênis no começo do filme (cena cortada por exigência de Xaver), o pai estaria sendo retratado de forma muito negativa e os símbolos cristãos utilizados de maneira negativa para significar o mundo estreito, racista e pequeno daquela família. Na interpretação de Lardeau, não foi seu pai que Hanni matou, foi a própria idéia de paternidade em si – o princípio de reprodução da espécie. O órgão sexual mostrando na abertura do filme, que lembra as torres fálicas no cenário de Querelle (1982), não teria relação alguma com o prazer sexual. É uma “cabeça” de morte, é o pênis do pai (embora seja de Franz), é o que faz do pai um pai. Para a geração seguinte, resta a reprodução da morte – o abatedouro de frangos. A verdadeira questão do filme, conclui Lardeau, não é o pai, mas a geração das crianças, cercada de signos da morte: por trás do assassinato do pai corre a história de um infanticídio (18). Angela é apenas a mais nova vítima de um país que não consegue lidar com seu passado, numa época em que os pais dela tinham a idade que ela tem agora e viviam sob a tutela de um “pai” chamado Adolf Hitler.



No contexto
do cinema da ex-
Alemanha Ocidental
, Fassbinder redescobre
a família como um
verdadeiro c
ampo
de batalha
(19)

Wim Wenders e a Humanidade Perdida (I), (II), (final)
Uma Vida Não Tão Bela
Uma Judia Sem Estrela Amarela
As Mulheres de Rainer Werner Fassbinder (I), (II), (III), (IV), (V), (VI), (VII), (VIII), (IX), (X)

1. WATSON, Wallace Steadman. Understanding Rainer Werner Fassbinder: Film as Private and Public Art. USA: University of South Carolina Press, 1996. P. 169.
2. Idem.
3. Entrevista a Peter W. Jansen, 18 de março, 1978. Lebens Läufe. Südwestfunks, Baden-Baden, 1982. Documentário.
4. WATSON, Wallace Steadman. Op. Cit., pp. 5 e 167.
5. Ver nota 3.
6. ELSAESSER, Thomas. New German Cinema: A History. London: Macmillan, 1989. P. 228.
7. Idem, p. 240.
8. Ibidem, pp. 237-8.
9. LARDEAU, Yann. Rainer Werner Fassbinder. Paris: Éditions de l'Étoile/Cahiers du Cinéma, 1990. P. 18.
10. Idem, p. 83.
11. KATZ, Robert; BERLING, Peter. O Amor é Mais Frio do que a Morte. A Vida e o Tempo de Rainer Werner Fassbinder. Tradução Carlos Sussekind. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992. P. 123.
12. BAER, Harry. A Vida Sufocante de Fassbinder. “Posso Dormir Quando Estiver Morto”. Tradução Márcio Suzuki. São Paulo: Brasiliense, 1985. P. 88.
13. ELSAESSER, Thomas. R.W. Fassbinder. Un Cinéaste D’allemagne. Paris: Éditions du Centre Pompidou, 2005. P. 462.
14. LARDEAU, Yann. OP. Cit., pp. 94-5.
15. WATSON, Wallace Steadman. Op. Cit., pp. 118-9.
16. Idem, p. 163.
17. ELSAESSER, Thomas, 1989. OP. Cit., p. 218.
18. LARDEAU, Yann. OP. Cit., Pp. 99-100.
19. ELSAESSER, Thomas, 1989. OP. Cit., p. 269. 


19 de jan. de 2010

As Mulheres de Rainer Werner Fassbinder (VI)



“Margot     procura
em  vão  explicar  sua
condição   ao   marido
dizendo,    ‘eu    estou
com  medo  de...’,   sem
conseguir     completar
a   frase.   Certa   noite
ela   consegue   apenas
dizer,    ‘você    parece
tão longe de mim’”
(1)


 

Oprimidas Opressoras

Na opinião de Yann Lardeau, em filmes de Fassbinder como O Amor é Mais Frio que a Morte (Liebe ist kälter als der Tod, 1969), Os Deuses da Peste (Götter der Pest, 1969), Recrutas em Ingolstadt (Pioniere in Ingolstadt, 1970) e Cuidado com a Puta Sagrada (Warnung vor einer heilingen Nutte, 1970), a mulher é “inexistente”. Elas são totalmente apagadas pelos personagens masculinos e seus desejos são muito convencionais. Ou melhor, elas não tinham desejos senão pelas convenções (2).

A partir de certo momento, entretanto, é como se a mulher se tornasse para Fassbinder o arquétipo do oprimido: de Martha (1973) a Nora Helmer (1974), de O Medo Devora a Alma (Angst essen Seele auf, 1973) a Mamãe Kuster Vai ao Céu (Mutter Küsters Fahrt zum Himmel, 1975), de Uma Mulher de Negócios (Bremer Freiheit, 1972) a A Mulher do Chefe da Estação (Bolwieser, 1977), de Medo do Medo (Angst vor der Angst, 1975) a O Assado de Satã (1976). Sem esquecer a opressão silenciosa da mulher em Effi Briest (Fontane Effi Briest, 1974) como modelo (todas as imagens deste artigo são de Medo do Medo). Fassbinder admitir inclusive que as mulheres o interessem mais do que outros de seus personagens, como as crianças e os trabalhadores imigrantes:


“Quando nos confrontamos concretamente com a sociedade, descobrimos o problema das mulheres... Apesar de tudo, acho as mulheres mais apaixonantes [que as crianças ou os trabalhadores emigrantes]. As mulheres não me interessam apenas porque são oprimidas, não é tão simples. Os conflitos no interior da sociedade são mais apaixonantes de observar através das mulheres. Porque as mulheres, por um lado, são oprimidas, mas, segundo eu, elas também provocam essa opressão em função de sua situação na sociedade. Por sua vez, elas se servem disso como um instrumento de terror. São as figuras mais apaixonantes da sociedade, os conflitos são mais evidentes com delas” (3)

Uma Mulher Com Medo



Negligenciada   pelo
marido
, hostilizada pela
sogra  e  a  cunhada
,
resta o Valium para fazer
companhia a Margot





O roteiro de Medo do Medo foi desenvolvido por Fassbinder a partir das notas autobiográficas de Asta Scheib, uma jovem dona de casa do norte da Alemanha que mais tarde se tornaria escritora. Margot é uma tensa dona de casa da classe média alta às portas da insanidade. Em Martha, filme do qual de acordo com Wallace Steadman Watson Medo do Medo parece uma seqüência, havia um marido controlador, mas as razões de Margot para os recorrentes ataques de ansiedade são pouco evidentes. Lardeau também sugeriu que a revanche em Nora Helmer contra Helmut Solomon parece com a revanche que Martha não é capaz de realizar contra seu marido opressor (4).

Kurt, o marido de Margot, fica confuso com o comportamento neurótico da esposa. Mas não está particularmente preocupado, pois passa horas estudando para algum tipo de prova. Watson chama atenção para o comportamento dele, que parece repetir a atitude de Anna, a irmã do suicida Hans Epp em O Mercador das Quatro Estações (Der Händler der vier Jahreszeiten, 1971). Sendo assim, ela é deixada só, lendo, escutando música e olhando pela janela, temendo pelo próximo ataque de medo – assinalado na tela pela imagem ondulante; como bem lembrou Steadman, típico elemento hollywoodiano que indica perda de contato com a realidade.


Dr. Merck troca Valium
por sexo com Margot. Merck
também   é   o   nome   de   um
laboratório farmacêutico. Em se
tratando de Fassbinder, é difícil
falar em coincidências



Os especialistas que o marido de Margot leva a esposa são, no dizer de Steadman, muito confiantes em sua própria competência, discordando entre si quanto ao diagnóstico. O clínico não encontra nada errado no organismo dela e receita Valium. Um psiquiatra diz a Kurt que ela é esquizofrênica. Outro diagnostica depressão, que acredita poder ser curada mantendo-se a mente dela ocupada. Seja como for, Margot está praticamente sozinha e alienada. Seu marido a negligencia. Sua sogra e sua cunhada desaprovam o que chamam de comportamento anormal de Margot.

Até Bibi, a filha de quatro anos de Margot, se distancia da mãe. Sua única companhia é Bauer, nas palavras de Watson, “um vizinho maluco”. Margot também aprecia a gentileza do marido de sua cunhada. Margot até estimula uma ligação sexual com Dr. Merck, o farmacêutico da esquina, em troca de doses extras de Valium. Curiosa esta última ligação dela, já que existe um grande laboratório alemão chamado Merck – estaria Fassbinder passando aqui mais uma de suas mensagens subliminares?



Margot parece só
conseguir se comunicar
com Edda
, sua companheira de quarto silenciosa numa
clínica psiquiátrica




Quando Margot volta da clínica psiquiátrica, ela descobre que Bauer se enforcou. Ela acompanha pela janela o caixão sendo levado para a ambulância – uma cena que se prefigura quando Edda olhava pela janela enquanto Margot ia embora da clínica. Mais uma vez a imagem ondulante, acompanhada de um som de flauta, sugere que os problemas não acabaram. Ou talvez, conjectura Watson, sob medicação ela será capaz de controlar os sintomas de sua ansiedade, mesmo que nunca venha a alcançar as causas de tudo aquilo.

Angústias e Hipóteses

Embora a vida de Margot seja solitária e monótona, ela paradoxalmente jamais está só. Seja porque a câmera a surpreende acompanhando a vida na rua pela janela, ou sua sogra e cunhada que vem lhe dizer o que fazer, ou os vizinhos que a espionam de suas janelas, ou Bauer o vizinho maluco (ou que se passa por) que lhe espera todo dia na rua quando ela traz sua filha da escola. São olhares que se sucedem e se encaixam uns nos outros, rodeando e cercando a solidão desta mulher (5).

De acordo com Steadman, Medo do Medo antecipa alguns outros filmes de Fassbinder. O medo inexplicável de Margot anteciparia a angústia existencial generalizada em personagens dos filmes dos próximos dois anos. Como o jovem recém casado e muito problemático em Eu Quero Apenas que Vocês me Amem (Ich will doch nur, dass ihr mich liebt, 1976), a criança irada e sádica de Roleta Chinesa (Chinesisches Roulette, 1976) e a insanidade sutil de Hermann Hermann em Despair (1977).



O carro
blindado é o
equivalente do
Valium






Outra hipótese para a ansiedade de Margot estaria visível numa cena rápida. Vemos a rua através da janela do apartamento dela. De repente, bem próximo ao parapeito, percebe-se parte de um carro militar que passa (imagem acima). Uma imagem rápida e quase imperceptível, mas talvez remeta a hostilidade das autoridades e do público em geral as ações terroristas da esquerda (especialmente do grupo Baader-Meinhof) e a reação “contundente” a esse estado de coisas – um tema ao qual Fassbinder voltará.

“John Sandford indicou suas implicações políticas: a imagem sugere ‘a grande ansiedade agarrando esta sociedade toda... a repressão necessária para engarrafar as frustrações que ela criou. O carro blindado é o equivalente policial do Valium de Margot: uma tentativa de sufocar os sintomas, para aqueles que são muito míopes para curar a doença’” (6)

Notas:

Leia também:

Fassbinder e a Psicanálise
As Mulheres de Rainer Werner Fassbinder
(VII)
Berlin Alexanderplatz (I), (II), (final)

1. WATSON, Wallace Steadman. Understanding Rainer Werner Fassbinder: Film as Private and Public Art. USA: University of South Carolina Press, 1996. P. 145.
2. LARDEAU, Yann. Rainer Werner Fassbinder. Paris: Éditions de l'Étoile/Cahiers du Cinéma, 1990. P. 231.
3. Idem, pp. 153-4.
4. Ibidem, p. 163.
5. Ibidem, pp. 179-80.
6. WATSON, Wallace Steadman. Op. Cit., p. 146.


Postagem em destaque

Herzog, Fassbinder e Seus Heróis Desesperados

 Entre Deuses e Subumanos Pelo menos em seus filmes mais citados, como Sinais de Vida (Lebenszeichen, 1968), T ambém os Anões Começar...

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