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Roberto Acioli de Oliveira

Arquivos

18 de fev. de 2015

George Orwell, o Grande Irmão e a CIA


(...) O que está claro é o interesse do governo dos
 Estados Unidos  em incluir os cineastas  britânicos
 e os frequentadores  de  cinema  como parte de sua
campanha de propaganda anticomunista (...)” 

Tony Shaw (1)

Admirável Fim do Mundo

Os longas-metragens A Revolução dos Bichos (Animal Farm, direção Joy Batchelor e John Halas, 1954) (em desenho animado) e 1984 (Nineteen Eighty-Four, direção Michael Anderson, 1956), são adaptações para o cinema de livros homônimos do escritor George Orwell (pseudônimo de Eric Arthur Blair,1903-1950), produzidas na Inglaterra. Em 1984, Michael Radford dirigiu outra adaptação de 1984. Talvez 1984 seja a obra mais famosa a respeito da distopia. Em 1932, o inglês Aldous Huxley (1894-1963) publicou Admirável Mundo Novo (Brave New World), adaptado para televisão em 1980. Em 1946, Orwell sugeriu que Huxley se baseou em Nós, do russo Yevgeny Zamyatin (1884-1937), embora admita semelhança limitada, já que Huxley foca mais em questões psicológicas e biológicas do que políticas, como Zamyatin. Escrito em 1920, Nós foi proibido na União Soviética como “ideologicamente indesejável”, sendo publicado em inglês três anos depois – foi publicado em russo fora da União Soviética em 1927, num jornal de russos contrarrevolucionários emigrados (2). Huxley admitiu inspirar-se noutro britânico, H. G Wells (1866-1946). Em 1936, Daqui a Cem Anos (Things to Come, direção William C. Menzies), adaptação do texto homônimo de Wells por ele mesmo, fala de uma guerra interminável sucedida por um mundo novo, supostamente livre. Outros exemplos da distopia no cinema são Metropolis (1927), do alemão Fritz Lang; Alphaville (1965), do francês Jean-Luc Godard; Fahrenheit 451 (adaptação do livro homônimo de Ray Bradbury, 1966) de seu conterrâneo François Truffaut; THX 1138 (1971) do norte-americano então iniciante George Lucas. Brazil, o Filme (Brazil, direção Terry Gilliam, 1985), outro produto britânico, é considerado uma versão humorística de 1984. (imagem acima, "Liberdade é Escravidão", uma das palavras de ordem em Airstrip 1, anteriormente conhecida como Grã-Bretanha, no super Estado de Oceânia, 1984, versão de 1956)

“Anunciado como ‘o mais controverso filme do ano’, A Revolução dos Bichos foi lançado pela RKO em Nova York em dezembro de 1954, estreando em Londres um mês depois. Ele atraiu cobertura internacional imediatamente, auxiliado pela ‘espécie de publicidade inesperada antecipada pela qual Hollywood poderia sacrificar sua última fotografia de uma pinup. Uma recepção de gala nas Nações Unidas somou-se às ricas conotações políticas. Quando o Primeiro Ministro Winston Churchill reclamou que a voz do velho Major se parecia muito com a sua, evocando uma imagem do conservador convicto trocando de lugar com o pai do comunismo, o apelo do filme cresceu ainda mais” (3) (abaixo, o velho Major, A Revolução dos Bichos, 1954)


Churchill achou que a voz do velho Major
 se  parecia  com a sua,  a  ironia  é  que  todos
  os  animais   em   A   Revolução   dos   Bichos 
foram   dublados   pela   mesma   pessoa (4)

Antigo funcionário do Império Britânico (na Birmânia, atual Myanmar, e na Índia), pouco se fala da posição dúbia que Orwell adotava em relação ao colonialismo (que possibilitou à Inglaterra subjugar boa parte do globo terrestre na época), assim como de seu interesse na instauração de um governo socialista na Inglaterra (contudo, sem descartar a manutenção da monarquia britânica). Interesses aparentemente contraditórios para um escritor e jornalista lembrado por estes dois livros, considerados obras seminais do pensamento distópico e antitotalitário. Para compreender certos pontos de vista de Orwell (assim também como as razões que levaram à distorção de sua mensagem no cinema) é necessário ter em mente que, além do passado de funcionário do Império, o escritor viveu seus últimos anos durante a Segunda Guerra Mundial numa Inglaterra sitiada pelas forças de Adolf Hitler. Muito de seus escritos abordam a situação política na Grã-Bretanha e remetem a nomes como Winston Churchill, Josef Stalin, F. D. Roosevelt, Mussolini, Hitler, Lênin, Marx, o Imperador Hirohito do Japão e Mahatma Ghandi (a quem Orwell chamou de pacifista fora da realidade) – além de uma pletora de personalidades do mundo político britânico e mundial. Portanto, numa época em que conceitos como Democracia, Totalitarismo, Liberalismo, Imperialismo, Socialismo, Capitalismo e Comunismo, estavam sob fogo cerrado – embora a Guerra Fria tenha começado algum depois do término da Segunda Guerra Mundial, o Muro de Berlim, conhecido como Cortina de Ferro, seria levantado apenas em 1961. Para citar apenas um exemplo, até hoje se diz que o objetivo de Hitler era dominar o mundo e destruir países democráticos e pacíficos. Contudo, esses mesmos países (especialmente a Inglaterra de Orwell, França, Bélgica, Portugal e Espanha) eram imperialistas há séculos e transformaram grande parte do mundo em colônias de escravos, sugando tudo que podiam carregar. No caso da França, exemplo contraditório, o lema da revolução francesa ("Liberdade, Igualdade, Fraternidade) nunca diminuiu o interesse deste país pela dominação colonialista.

“(...) O valor de 1984 já era bem conhecido pelos propagandistas [norte-]americanos, tendo sido leitura obrigatória para os oficiais da Diretoria de Estratégia Psicológica em 1952. A intenção era, de acordo com o presidente da Agência de Informação dos Estados Unidos, fazer o filme anticomunista mais devastador de todos  os tempos” (5) (imagem abaixo, "Ignorância é Força", palavra de ordem em Airstrip 1, no super Estado de Oceânia, 1984, versão da BBC, 1954)

Desinformação e Mundo Livre


(...) Os  milhões  que  já  ouviram falar  do ‘Big Brother’
e do ‘Quarto 101’ não sabem nada sobre seu progenitor.  A ignorância
sobre  Orwell  encontra-se  também  nos  círculos acadêmicos e entre
aqueles que se consideram pontífices do jornalismo (...)

Peter Davison (6)

Orwell foi um anticomunista de carteirinha e tudo que fez foi mostrar da maneira mais clara possível que o Grande Irmão morava na União Soviética, e que a salvação estava do “lado de cá”, naquilo que em breve se autodenominou “mundo livre”. Correto? Na opinião de Tony Shaw, a longevidade da rala tradução para o cinema dos dois livros mais famosos de Orwell, A Revolução dos Bichos e 1984, é a prova incontestável da força das distorções produzidas pela vertente cultural da Guerra Fria. Nos tempos atuais, as primeiras décadas do século XXI, quando a islamofobia ocidental procura (à custa do terrorismo de grupos radicais islâmicos) fabricar um estado de guerra permanente entre o mundo cristão e o mundo muçulmano, é preciso lembrar que para Orwell um dos grandes empecilhos à criação dos Estados Unidos da Europa Socialista era a Igreja Católica (7). Orwell se inspirava nos princípios do que chamava de socialismo democrático, uma “terceira via” entre o capitalismo e o comunismo, proposta por um grupo de escritores de esquerda do qual participava – vale lembrar que o socialismo democrático também era a bandeira dos chamados “socialistas anticomunistas”, grupo cooptado pela CIA (Agência Central de Inteligência, dos Estados Unidos) para servir a seus próprios interesses ideológicos (8). Contudo, como que por um passe de mágica, o que vemos na tela se resume a um anticomunismo antissoviético. Como isso aconteceu? Qual seria então a mensagem original e por que motivo essas primeiras versões cinematográficas se distanciam do original. Não seria a velha problemática da distorção das obras literárias quando transpostas para o cinema? (9). Tony Shaw resaltou que não existe dúvida em relação ao anticomunismo de Orwell. Contudo, seu radicalismo inglês estava mergulhado num apaixonado sentido de independência.

A Prevenção da Literatura, sua defesa da liberdade intelectual publicado em 1946, alertava a respeito de como burocratas, soberanos da imprensa e magnatas do cinema conspiram ‘para transformar o escritor, da mesma forma que qualquer outro artista, num oficial subalterno trabalhando em temas transmitidos de cima’. Orwell se recusou a sucumbir, acreditando que a imaginação, como certos animais, não irá se reproduzir no cativeiro” (10) (imagem abaixo, Jones impõe o medo pela última vez, em instantes terá início a revolução)


“Estou escrevendo uma pequena sátira que talvez o divirta quando
sair, mas é algo tão pouco politicamente correto que não tenho certeza
se alguém vá publicá-lo. Talvez isso lhe dê uma indicação do tema”

George Orwell,
Referência à Revolução dos Bichos, em carta
a  Gleb  Struve,  17 de fevereiro de  1944  (11)

Daniel J. Leab mostrou até que ponto se pode distorcer as palavras de um escritor. A ênfase no antisstalinismo de Orwell não leva em consideração sua celebração da derrota (em grande medida pelas mãos dos soviéticos) das forças nazistas que pretendiam destruir o bolchevismo e o Estado criado por ele. Além do mais, após derrotarem Jones e seus aliados e antes de Napoleão e seus porcos tomarem o poder, os animais da fazenda trabalham juntos harmoniosamente por algum tempo e suas condições melhoram significativamente apesar das dificuldades. Leab mostra que Orwell não estava condenando as “intenções benevolentes do Socialismo”, mas a tendência de quase todo movimento utópico em levar à “extinção da individualidade, cultura e emoção”. Embora pareça óbvio, e são palavras de Leab, não devemos perder de vista que Orwell era socialista. Trata-se de um aspecto fundamental do trabalho de Orwell que muitos preferem ignorar. Um exemplo é a introdução de uma edição norte-americana de A Revolução dos Bichos em 1956, escrita por Christopher Montague Woodhouse – historiador, herói condecorado, membro do Partido Conservador, homem de negócio bem sucedido e com relações no serviço secreto. Woodhouse louva a perspicácia e a visão política de Orwell, citando Por que Eu Escrevo (1947), famoso ensaio do escritor: “Cada linha que tenho escrito desde 1936 foi contra o totalitarismo”. Contudo, Woodhouse omite o final da sentença, “e pelo socialismo democrático”. Leab enfatiza a fraude por parte de Woodhouse, cujo único objetivo é adaptar o livro de Orwell a um ponto de vista particular, procedimento normalmente utilizado pelo pessoal da CIA encarregado de transformar A Revolução dos Bichos numa peça de propaganda não apenas contra o totalitarismo soviético, mas também insinuando que totalitarismo não existe nos países capitalistas  (12). Segue a citação integral (incluindo a ênfase em itálico) do trecho do ensaio de Orwell, cuja referência é a guerra civil espanhola: 

“A guerra espanhola e outros eventos em 1936-37 pesaram na balança e, depois desta época, eu sabia quais eram minhas opiniões. Cada linha de trabalho sério que eu escrevi desde 1936 foi feita, direta ou indiretamente, contra o totalitarismo e a favor do socialismo democrático, como eu o entendo (...)” (13) (imagem abaixo, a distorção da premissa da revolução: “todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais do que outros”, A Revolução dos Bichos, 1954)


A Revolução dos Bichos foi o primeiro
 desenho  animado  inglês  produzido  para
adultos   politicamente   conscientes (14)

Orwell era expressamente contra a alteração da mensagem de 1984 por editores e Sonia Blair, a viúva (que cedeu os direitos desta obra para o cinema), teria ficado chocada com o novo final para primeira versão cinematográfica. É o caso de perguntar se o escritor teria permitido que isso acontecesse (15). A Revolução dos Bichos foi concebida durante a Guerra Civil Espanhola, quando Orwell foi voluntário junto aos Republicanos (uma coalizão de forças de esquerda), em luta contra os Nacionalistas do general Francisco Franco (que era apoiado pelos nazistas alemães e pelos fascistas italianos). Escrito entre 1943 e 1944, não foi senão a partir de agosto de 1945 que surge nas livrarias a alegoria baseada na revolução russa. Shaw especula se o desinteresse dos editores foi a incapacidade de perceber o potencial comercial do livro ou, mais provavelmente, receio de que a retórica antisstalinista pudesse desagradar o líder soviético, então aliado das potencias ocidentais e cujo exército foi peça crucial na derrota de Hitler. O próprio Ministério da Informação inglês advertiu à pelo menos uma editora de que a utilização de porcos representando a casta dos governantes seria particularmente ofensiva aos soviéticos. A Revolução dos Bichos foi um sucesso de público imediato. Tony Shaw resume os objetivos de Orwell em dois temas principais. Primeiramente, expor o mito soviético através de uma história de fácil compreensão e, ao mesmo tempo, condenar a tirania universalmente – neutralizar a hipocrisia e o culto da personalidade na mente do homem, prevenindo um futuro que considerava ameaçado pelo totalitarismo. Em segundo lugar, referir-se à revolução russa como uma traição da revolução, concluindo que o socialismo ainda não havia sido atingido, senão enquanto uma ideia pervertida.

“Orwell morreu num momento chave, depois do início da Guerra Fria, mas antes que suas dimensões globais se tornassem aparentes. Consequentemente, apesar de haver explicitado num de seus últimos ensaios o desejo de um ‘Estados Unidos da Europa Socialista’, independente [dos Estados Unidos] e da Rússia, o debate seguiu em relação à coloração precisa das afinidades políticas de Orwell (...)” (16) (imagem abaixo, Jones impõe o medo pela última vez, em instantes terá início a revolução)


As   distorções   em   A  Revolução  dos  Bichos   e   1984  confirmam
a  importância  do  cinema britânico,  e  europeu,  como lugar da Guerra
Fria  cultural internacional.  O público, os críticos, e mesmo a chefia  das
equipes de produção, nada sabiam das manobras políticas secretas (17)

No capítulo final de A Revolução dos Bichos, Orwell procurou antecipar e advertir contra a reemergência da rivalidade entre o capitalismo e o comunismo após a Segunda Guerra Mundial – o tipo do sectarismo que em 1984 o escritor classificou como prenúncio de uma disputa que fomentaria uma guerra permanente. De acordo com a opinião de Shaw, é irônico que A Revolução dos Bichos e 1984 tenham sidos utilizados como propaganda antissoviética. Em 1949, o Departamento de Pesquisa de Informações promoveu a tradução e distribuição do livro na Europa e Oriente Médio, em associação com o Departamento de Estado norte-americano. Orwell apoiou essas atividades no último ano de sua vida licenciando gratuitamente traduções fiéis de A Revolução dos Bichos no mercado da Europa Oriental. No mesmo ano, ele debateu com o Departamento de Pesquisa de Informações a melhor forma (incluindo o cinema) de atacar o stalinismo, inclusive divulgando sua lista de personalidades comunistas. De acordo com Shaw, é um erro concluir que a aprovação da postura antissoviética do governo inglês por parte de Orwell significa uma rejeição do socialismo. É mais provável que se trate de uma forma “mais agressiva” de defesa do socialismo democrático, a “terceira via”. Em 1950, o Departamento de Pesquisa de Informações compra os direitos de A Revolução dos Bichos para histórias em quadrinhos a serem distribuídas aos jornais nos países em desenvolvimento - onde, nos termos de uma circular interna do orgão, tal sátira do regime comunista na União Soviética seria uma arma mais efetiva de propaganda. A partir daí, a ideia de fazer um filme amadureceu.

“Diversas personalidades de destaque em Hollywood – entre eles John Ford e John Wayne – apoiaram a campanha [do governo norte-americano], “Liberdade Militante”, nos anos 1950, concebida ‘para explicar em termos simples as verdadeiras condições existentes no comunismo, e explicar os princípios em que se baseia o modo de vida do Mundo Livre’ (18). Ao promover a distribuição de documentários e filmes na Grã-Bretanha e em toda parte, maiores seriam as chances tanto de manter um consenso antissoviético no Ocidente quanto encorajar a dissidência no interior dos redutos soviéticos (...)” (19)


“[A Igreja Católica] tornará impossível o estabelecimento
do  verdadeiro socialismo,  por que a influência dela é e sempre
 deve   ser   contra   a    liberdade    de   pensamento   e   expressão, 
contra  a  igualdade  entre  os  homens e  contra  qualquer  tipo
de sociedade com tendência a promover a felicidade terrena”

George Orwell,
Toward European Unity, Partisan Review, julho-agosto, 1947 (20)

Tanto aqui como lá nada muda, pois parece que os fins justificam os meios. Diante de tudo isso, a ênfase da crítica na competência técnica e inovação da animação britânica em A Revolução dos Bichos poderiam até soar suspeitas. Alguns jornais saldaram a peça de propaganda, enquanto outros questionaram as mudanças em relação ao livro original, especialmente em relação à sequência final. Certamente, a expectativa dos produtores era que os espectadores comuns interpretassem o filme como uma adaptação honesta de um importante livro escrito por um radical venerado. A União Soviética deveria ser considerada imperfeita, superável e autodestrutiva. O jornal católico The Universe monta uma salada, declarando que o filme mostra que o Comunismo é um sistema do mal e que nem se importa com a felicidade material. Outros o consideraram o mais importante documento anticomunista de nosso tempo. Para a promoção do filme, o Comitê Americano para a Liberdade Cultural, ramificação norte-americana do Congresso para a Liberdade Cultural, apresentou A Revolução dos Bichos no prestigioso Paris Theater em Nova York, uma plataforma para o sucesso nacional e internacional. Tiras de quadrinhos surgiram na imprensa britânica e internacional, enquanto a publicidade (incomum para o período) promoveu bonecos dos animais para as crianças. Apesar de tudo isso, o filme não foi um sucesso de bilheteria. Há controvérsias se a obra conseguiu prosperar em termos políticos, mas foi traduzida em muitos idiomas. Na França, por exemplo, onde inicialmente o título seria União das Repúblicas Socialistas Animais, o personagem de Napoleão teve o nome trocado para César, sendo saudado como uma poderosa paródia do regime soviético – a ideia do título, um evidentemente trocadilho com União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), nome completo da União Soviética, foi trocado para não ofender os stalinistas (21).

“A CIA ajudou a financiar a distribuição, apesar de muitas vezes ser impotente para contornar as proibições impostas à exibição do filme, principalmente atrás da Cortina de Ferro. Se o alvo prioritário do filme foi o elemento (potencialmente) dissidente sofrendo sob o jugo comunista, então ele falhou. Se, por outro lado, o sucesso for medido em termos de alargamento da percepção de A Revolução dos Bichos, antes confinado em grande medida à mentalidade literária das classes médias, uma imagem diferente emerge. A perspectiva muda novamente se o filme for examinado através de sua mensagem da Guerra Fria sutilmente manipulada, servindo tanto como aviso aos Estados em desenvolvimento e um lembrete aos céticos no Ocidente em relação à ficha suja soviética. O impacto potencial do filme também não deve ser restringido no tempo. No começo dos anos 1960, A Revolução dos Bichos (e 1984) tornaram-se leitura padrão nas escolas britânicas e norte-americanas. A existência do filme de animação o transformou num popular auxiliar pedagógico, auxiliando no processo de fornecer a nova geração com um fundamento tendencioso em relação às origens da Guerra Fria” (22) (imagem abaixo, Napoleão percebe que deve fazer alguma coisa em função da morte de Sansão, então envia um de seus porcos para convencer aos outros animais que suas últimas palavras foram de exaltação ao líder)

A Propaganda dos Outros


Goebbels   sempre   insistiu  em  afirmar  que  o
melhor   veículo   para   a   propaganda   ideológica
é   o   entretenimento   sem   conteúdo   político

Na época em que Orwell estava escrevendo seus libelos contra o totalitarismo, a indústria cinematográfica de Hitler e Josef Goebbels (seu Ministro da Propaganda) já havia produzido filmes horripilantes como O Judeu Eterno (Der Erwige Jude, direção Fritz Hippler, 1940) (propaganda antissemita de baixo nível) e outros mais elaborados como O Judeu Süss (Jud Süß, 1940, direção Veit Harlan). Lançado no mesmo ano da subida de Hitler ao poder, Mocidade Heroica (Hitlerjunge Quex: Ein Film vom Opfergeist der deutschen Jugend, direção Hans Steinhoff, 1933) retrata a vida da juventude alemã e a tentativa dos nazistas de afastar a influência comunista sobre eles e a sociedade como um todo. Eric Rentschler já mostrou que este filme é um exemplo de que soa pueril a tentativa de sugerir que os nazistas só eram capazes de produzir propaganda de baixo nível – o antropólogo Gregory Bateson, encarregado pelo governo dos Estados Unidos de analisar o filme, reconheceu seu poder retórico. A propaganda anglo-americana, talvez em função justamente da guerra, insistia em classificar os funcionários de Goebbels como capazes apenas de produzir material primitivo e sem refinamento. Contudo, talvez seja preciso admitir a falácia de considerar a plateia norte-americana de então como perfeitamente capaz de evitar cair nas armadilhas da comunicação de massa (pelo menos a dos nazistas). As produções hollywoodianas da década de 1940 representavam como risíveis os estratagemas alemães. O objetivo disso era a construção da confiança do público, e encontrava justificativas no contexto da guerra. Entretanto, afirma Rentschler, no caso de Mocidade Heroica, tal presunção se transforma numa deficiência de interpretação, cegando o espectador em relação às sutilezas textuais (23).

“Repetidamente os comentadores abordam o confronto entre o Líder de Brigada Cass [o representante dos nazistas] e Herr Völker [o pai sem dinheiro e comunista] como a ‘cena chave’, um duelo onde antigos inimigos de classe ‘lutam pela mente do jovem herói’ [o filho de Völker]. Essas análises se concentram no diálogo, lidando com o filme como se fosse um roteiro escrito. Não lemos nada a respeito de composição, bloqueio, gesto, a respeito da superfície visual do texto em questão. Essa ‘cena chave’, do mesmo modo, parece estar isolada. Não percebemos o sentido preciso de seu lugar numa estrutura narrativa maior. Aqui, a propaganda nazista parece se expressar abertamente e apoditicamente [de forma convincente]. Como Klaus Theweleit nos lembra, no entanto, não nos atrevemos a habitar somente no que a linguagem fascista ‘diz’; precisamos compreender como funciona. De alguma forma, a cena em questão e a narrativa como um todo dependem mais fortemente na persuasão tátil do que verbal. O filme apela a um sentimento, mais do que um espectador pensante. Se o membro do Partido [Nazista] prevalece, não é por causa do que ele diz, mas em função de como ele fala. E o que convence é o toque pessoal” (24)


Em 1993, a BBC transmitiu Além do Cidadão Kane, documentário
 que  conta   história   da   relação   da   emissora   de    tv  Rede  Globo
 com  a esfera do poder político no Brasil. Consta que o documentário
teve  sua  veiculação proibida no país e até no  resto  do  mundo (25)

Os filmes alemães realizados sob o patrocínio do Nazismo deveriam ocupar espaço psíquico, funcionado como uma espécie de controle remoto emocional. Na busca desse cinema definitivo era para Hollywood que Goebbels e seus lacaios olhavam na busca de um modelo. Os desenhos de Walt Disney eram profundamente considerados por Hitler e por Goebbels, que elogiava muito os desenhos com o rato Mickey e Branca de Neve e os Sete Anões. Contudo, uma vez em lados opostos, a adesão de Disney ao esforço de guerra norte-americano produziria muitos desenhos animados politicamente incorretos com o objetivo de demonizar tanto nazistas quanto japoneses, todos convenientemente banidos depois de encerrado o conflito – ou melhor, ser politicamente incorreto apenas enquanto for conveniente. Rentschler mostrou que, com O Judeu Süss, os nazistas fabricaram um inimigo que serviu como meio de autossustentação. O outro surge como uma necessidade existencial: de forma a sentir sua própria existência e confirmar sua própria realidade, os nazistas precisavam dos judeus. O antissemitismo nazista construiu uma campanha publicitária abrangente, trouxe o inconsciente para fora e fez um uso racional da irracionalidade. Por outro lado, se Hollywood produzia filmes pró-soviéticos como o incoerente Missão em Moscou enquanto os soviéticos eram necessários para conter Hitler e aliviar a barra dos ingleses, depois da guerra a situação se inverteu,os filmes anticomunistas passam a revelar uma obsessão neurótica com o forasteiro, o desconhecido, “o Outro” – por exemplo, Vampiros de Almas (Invasion of the Body Snatchers, 1956). Depois da guerra, quando mais ou menos a metade da Alemanha passou a “pertencer” ao “Mundo Livre”, Hollywood magicamente abandonou o tom politicamente incorreto em relação ao país.

“(...) Assim como o Capitão América tinha deixado de combater os nazistas para dar combate aos comunistas, a atitude dos filmes norte-americanos para com a Alemanha sofreu uma mudança radical, e o inimigo vencido passou a ser retratado sob a forma de combatentes heroicos e oponentes dignos [- veja Raposa do Deserto (The Desert Fox – The Story of Rommel, direção Henry Hathaway, 1951); Mares Violentos (The Sea Chase, direção John Farrow, 1955) e A Raposa do Mar (The Enemy Below, direção Dick Powell, 1957)]. À media que os inimigos da segunda-feira transformavam-se nos amigos da terça, Hollywood mostrou com que facilidade podia arrancar os ‘rótulos de Boa e Má de uma nação e [colá-los] em outra” (26)


 Em certos países,  a  manipulação  do consenso
é confundida com jornalismo  de  credibilidade

Perdida a guerra, a Alemanha será dividida e a parte oriental, que se chamou República Democrática da Alemanha (RDA), foi administrada pelos comunistas até que a União Soviética faliu no final da década de 1980. Erich Fritz Emil Mielke foi um oficial da polícia secreta na antiga Alemanha Oriental – Simon Wiesenthal, sobrevivente do Holocausto e caçador de nazistas, teria confirmado que a Stasi (Staatssicherheit) era muito pior do que a Gestapo. Florian Henckel von Donnersmarck, que dirigiu A Vida dos Outros, contou que “certa vez Mielke disse, ‘quero saber tudo que acontece neste país!’. Assim, o ‘aparelho’ cresceu e se fortaleceu ano após ano até atingir proporções gigantescas, das quais temos conhecimento. Um grupo que Mielke e sua turma não conseguia compreender e para o qual montou um ‘aparelho’ enorme foram os artistas. Ninguém sabe o que os artistas pensam. Mielke também não sabia, e colocou muita gente atrás deles. Tudo o que está [em A Vida dos Outros] corresponde à realidade” (27). Em 2006, A Vida dos Outros (Das Leben der Anderen) foi lançado na Alemanha pós-Guerra Fria. O filme retrata a vida na extinta Alemanha Oriental no final dos anos 1980, mostrando como a população era literalmente submetida à vigilância total, e qualquer um poderia ser informante da Stasi – contudo, Ulrich Mühe (ele próprio espionado pela Stasi), que faz o papel do espião Wiesler, admitiu que o clima de “terra de ninguém” resultante da visão de uma cidade com ruas vazias não corresponda à realidade, “claro que o sol também brilhava na RDA, e as ruas não eram tão vazias como o filme mostra e havia mais carros. Mas no sentido dramático o trabalho é legítimo” (28).

“(...) O sistema de vigilância onipresente sustentando a ditadura do Partido da Unidade Socialista Alemã (Sozialistische Einheitspartei Deutschlands) é direcionado igualmente contra oponentes e partidários, e funciona justamente devido ao fato de que o medo irracional de ser vigiado secretamente é constantemente confirmado como real. Com um uso magistral do duplipensar orwelliano, Wiesler [capitão da Stasi] demonstra que ninguém está fora de suspeita e que não existe refúgio seguro contra os olhos e ouvidos do Grande Irmão na República Democrática Alemã de 1984” (29) (imagem abaixo, Napoleão se farta com a geleia na casa de Jones, em pouco tempo o porco-líder vai se mudar para lá)

O Fim Justifica os Meios


Aparentemente, um dos interesses maiores de
Sonia  Blair  ao ceder os direitos de  A Revolução
dos  Bichos  era  conhecer  o  ator  Clark Gable

Ao que parece, Frances Stonor Saunders e Tony Shaw, em 1999 e 2001 respectivamente, foram os primeiros a mostrar que a verdadeira origem da versão em desenho animado de A Revolução dos Bichos está nos serviços secretos norte-americanos, tema aprofundado em 2007 por Daniel J. Leab em Orwell Subverted: The CIA and the Filming of Animal Farm. Em junho de 1948, o Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos emitiu diretiva (30) criando uma nova agência, chamada Escritório de Coordenação Política (anteriormente Escritório de Projetos Especiais), cuja função será conduzir operações (que poderiam ser negadas se necessário) nos campos político, econômico, paramilitar e psicológico, cuja tarefa é conter supostas atividades secretas “perversas” da União Soviética e seus países satélites para desacreditar e derrotar os objetivos e atividades dos Estados Unidos e outras potências ocidentais. O Escritório de Coordenação Política opera, com suporte direto da CIA (criada no ano anterior), sob a direção política dos Departamentos de Defesa e Estado. Frank Wisner, que comandava o Escritório, era fascinado pelo poder da propaganda e montou o Grupo de Trabalho Sobre de Guerra Psicológica – anteriormente Wisner era o contato do Exército dos Estados Unidos com a Organização Gehlen, unidade de informações do exército nazista que operava no front oriental durante a Segunda Guerra, mantida intacta pelos norte-americanos para espionar a União Soviética. Shaw conta que esse workshop de guerra psicológica era composto quase inteiramente de alunos com orientação liberal da Universidade de Princeton, agindo como grupo de reflexão inventando esquemas não convencionais para minar a solidariedade entre os países da Europa Oriental e aprofundar as técnicas de publicidade anticomunista norte-americana (31). É neste universo que A Revolução dos Bichos e 1984 serão reconfigurados para se adequarem aos interesses anglo-americanos na Guerra Fria. Em carta de 18 de maio de 1944, Orwell dá indicações desse universo ao contextualizar 1984:

“(...) Hitler, sem dúvida, desaparecerá em breve, mas somente às custas de fortalecer (a) Stalin, (b) os milionários anglo-americanos e (c) todas as espécies de pequenos fuhrers do tipo de De Gaulle Todos os movimentos nacionalistas do mundo, até mesmo aqueles que se originaram na resistência à dominação alemã, parecem assumir formas não democráticas, agrupar-se em torno de algum Führer super-humano (Hitler, Stalin, Salazar, Franco, Gandhi, De Valera são todos exemplos variados) e adotar a teoria de que o fim justifica os meios. Em toda parte, o movimento do mundo parece ir na direção de economias centralizadas que podem ‘funcionar’ no sentido econômico, mas que não são organizadas de forma democrática e que tendem a estabelecer um sistema de castas. Com isso, vão juntos os horrores do nacionalismo emocional e uma tendência descrer na existência da realidade objetiva, porque todos os fatos precisam se adequar às palavras e profecias de algum Fuhrer infalível. Em certo sentido, a história já deixou de existir, isto é, não há uma história de nosso tempo que possa ser universalmente aceita, e as ciências exatas estão em perigo assim que a necessidade militar deixe de satisfazer as pessoas. Hitler pode dizer que os judeus começaram a guerra e, se ele sobreviver, isso se tornará a história oficial. Ele não pode dizer que dois mais dois são cinco porque para os propósitos, digamos, da balística, eles têm de somar quatro. Mas se chegar o tipo de mundo que temo, um mundo de dois ou três super-Estados incapazes de conquistar um ao outro, dois e dois podem se tornar cinco se o Führer assim desejar. Essa é, tanto quanto posso ver, a direção em que avançamos de fato, embora, claro, o processo seja reversível” (32) (imagem abaixo, tentativa dos fazendeiros-capitalistas retomarem a fazenda)



“O  que  esta  guerra  tem  demonstrado  é  que  o capitalismo
 privado  – quer dizer, um sistema econômico onde terra, fábricas, 
minas   e   transporte   são   propriedade   privada    e    operados
tendo   o   lucro   como   único   objetivo     não  funciona (...)

George Orwell,
The Lion and the Unicorn: Socialism and the English Genius, pt.3, 19 de fevereiro de 1941 (33)

Missão em Moscou (Mission to Moscow, direção Michael Curtiz, 1943), lançado pela Warner Brothers, pode ilustrar a descrição de Orwell. Baseado no livro de memórias de Joseph E. Davies, embaixador dos Estados Unidos na URSS (1937-8), o filme é um exemplo (dentre vários) de distorção da história com o objetivo de criar uma empatia pela União Soviética (apenas porque, na época, o país era aliado das potencias ocidentais contra Hitler) (34). Em 1950, dois componentes do grupo de Princeton citado acima, Finis Farr e Carleton Alsop, antigo produtor de cinema e agente de Hollywood, iniciaram negociações com Sonia Blair, viúva de Orwell, pelos direitos de filmagem de A Revolução dos Bichos. Isto era parte da estratégia do Escritório de Coordenação Política para criação de uma imagem mais progressista do Ocidente. O esquema também estava ligado à “Campanha pela Verdade”, lançada pelo presidente norte-americano Harry Truman (1884-1972) em abril de 1950, anunciando campanha mais abrangente e agressiva de propaganda dedicada a manter a fé no “Mundo Livre” (enquanto desestabilizavam a hegemonia soviética na Europa Oriental). O cinema teria um papel fundamental a nível mundial, mas sem possibilidade de ligar o governo dos Estados Unidos ao financiamento da produção cinematográfica – Cecil B. DeMille (1881-1959), o lendário cineasta, que já fazia parte do conselho do Comitê Nacional por uma Europa Livre, foi nomeado chefe consultor de cinema da Agência de Informações dos Estados Unidos. Para Frances Stonor Saunders, a consultoria de DeMille foi “uma grande jogada” para os propagandistas norte-americanos, pois com 135 unidades do Serviço de Informações em 87 países, contavam com ampla rede de distribuição.

“Em 23 de abril de 1953, após sua nomeação como consultor cinematográfico especial do governo, Cecil B. DeMille entrou no escritório de C. D. Jackson. Ao escrever a Henry Luce, duas semanas depois, C. D. disse que DeMille ‘está totalmente do nosso lado e (...) justificadamente impressionado com o poder dos filmes norte-americanos no exterior. Ele tem uma teoria, a qual subscrevo completamente, de que o uso mais eficiente dos filmes norte-americanos não está em conceber um filme inteiro para lidar com certo problema, porém em nos certificarmos de que, num filme ‘normal’, sejam introduzidos a fala, o aparte, a inflexão ou o movimento de sobrancelhas corretos. Disse-me ele que, se eu lhe desse a qualquer momento um problema simples, referente a um país ou uma área, ele encontraria um modo de abordá-lo num filme’” (35) (imagem abaixo, momento chave do interrogatório de Winston Smith, quando O'Brien insiste em fazê-lo entender quantos dedos ele deveria dizer que está vendo. Lição definitiva a respeito da doutrinação de corações e mentes, a resposta correta só pode ser a verdade mais conveniente para aqueles que permitimos controlarem nossas vidas, em especial na política partidária, nos meios de comunicação de massa e na imprensa. 1984, versão da BBC, 1954)


O cineasta Joseph L. Mankiewicz (1909-1993) é geralmente acusado de distorcer o romance do escritor Graham Greene, The Quiet American. Contudo, foi o produtor norte-americano Walter Wanger quem, na adaptação para o cinema em 1958, transformou o livro, que criticava o envolvimento dos Estados Unidos no Vietnã, numa peça de propaganda anticomunista. Greene não reclamou. Não surpreende, já que ele era funcionário do Serviço Secreto norte-americano desde a guerra. O inglês Graham Greene, considerado um dos escritores mais influentes do século XX, se encaixa nessa história por ser mais um nome conhecido que se envolve com a propaganda do governo britânico, especificamente no campo da literatura. Entre outros serviços, a Divisão Imperial encomendou panfletos durante a Segunda Guerra Mundial para combater a propaganda de grupos nacionalistas indianos nos Estados Unidos (a Índia foi a maior colônia britânica). O Ministério da Informação britânico editou naquele país (que ainda não havia entrado na guerra ao lado dos ingleses) um livro definindo os benefícios do imperialismo britânico. Em março de 1951, com assessoria de Carleton Alsop e financiamento do Escritório de Coordenação Política, Sonia Blair vende os direitos do livro de Orwell, A Revolução dos Bichos, para a produtora independente Louis de Rochemont Associates. Educado em Harvard, Louis de Rochemont criticava o senador Joseph McCarthy, um dos pais da paranoia anticomunista nos Estados Unidos da década de 1950 – evidentemente, o produtor entra na lista de suspeitos de atividades comunistas. Apesar disso, aumentam suas relações com os serviços secretos. De fato, desde a guerra, de Rochemont escreveu e produziu The March of Time, um seriado (que utilizava reportagens encenadas e se dividiu entre rádio e cinema de 1931 a 1951) engajado no esforço de guerra e “serviços posteriores” - Nicholas John Cull afirmou que a série foi importante na difusão da expressão “propaganda da Guerra Fria" (36)

Para Tony Shaw, é difícil dizer se foi por aí que de Rochemont contatou o Escritório de Coordenação Política, mas sua atração por A Revolução dos Bichos não foi apenas artística, considerando-a bom argumento contra os soviéticos. Em 1951, contrata o casal John Halas e Joy Batchelor, respeitado na área da animação e com larga experiência em encomendas para o governo inglês, especificamente no Ministério da Informação e no Escritório Central de Informação – além da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), Administração para a Cooperação Europeia, empresas petrolíferas privadas como Esso, Shell e British Petroleum. Dentre as razões da escolha, alegações de infiltração comunista na indústria de animação norte-americana e a certeza de que a menor interferência dos Estados Unidos aumentaria o potencial de propaganda – embora saibamos a direção foi entregue a John Reed, diretor de animação da Disney desde 1935. Com o tempo, o casal percebe a natureza política do projeto, embora não haja evidência de que estivessem a par de sua origem. Humanistas, Halas e Batchelor acreditavam no potencial do cinema para expressar ideias internacionalistas, assim como na simplicidade da mensagem da mensagem de A Revolução dos Bichos: o poder corrompe. Tony Shaw não sabe dizer se o Secretário de Estado norte-americano John Foster Dulles tinha em mente A Revolução dos Bichos (muito menos o filme do livro) quando discursou diante do Comitê de Relações Exteriores do Senado e 15 de julho de 1953, mas o governo dos Estados Unidos certamente desejava incluir o cinema britânico em sua cruzada anticomunista. De acordo com Dulles...

“O comunismo acredita que os seres humanos não são nada mais do que animais mais ou menos superiores... e que o melhor tipo de mundo é esse mundo organizado como uma fazenda bem administrada é organizada, onde certos animais são levados para o pasto, trazidos de volta e ordenhados, e a eles é dado um celeiro como abrigo sobre suas cabeças... Não vejo como, enquanto o comunismo soviético mantiver estes pontos de vista... possa haver qualquer reconciliação permanente” (37) (imagem abaixo, os frutos do comércio de Napoleão com o capitalista, às custas do trabalho dos animais da fazenda)

O Tamanho da Interferência


(...) Que [A Revolução dos Bichos e 1984]
precisassem ser tão profundamente distorcidas
ilustra   a   distância   ideológica   entre   Orwell
e   a   ortodoxia   da   Guerra   Fria (...)” (38)

O desenho animado de A Revolução dos Bichos segue a narrativa original, mas reduziu o enredo de Orwell ao essencial. Muitas foram as fontes indicando alterações, de Rochemont era apenas mais uma delas. Ele chegou a discutir quando os porcos deveriam tomar o poder e quando o slogan “todos os animais são iguais” deveria aparecer, insistindo também para que o comportamento e conduta de Napoleão fossem modificados para torná-lo mais autoritário, propondo mudanças em suas propostas e discurso. A presença de Lothar Wolff como supervisor aumenta o controle de de Rochemont, somando à equipe um especialista em propaganda da Guerra Fria que também estava familiarizado com as plateias europeias. Fredric Warburg, que havia se empenhado pessoalmente para a publicação de 1984 e ficou muito amigo de Orwell, é mais um dos atraídos pelo projeto de A Revolução dos Bichos em desenho animado, tendo visitado o estúdio várias vezes. Entre 1951 e 1953, Warburn foi tesoureiro da Sociedade Britânica para a Liberdade Cultural (alguns de seus membros tinham postos altos na BBC), um organismo secretamente financiado pela CIA através da Campanha para a Liberdade Cultural. Este último foi um movimento intelectual e artístico durante a Guerra Fria que liderava uma ofensiva liberal contra comunistas e simpatizantes. Tony Shaw admite ser impossível afirmar qual foi o efeito da presença de Warburg, mas é significativo que ele tenha se equivocado ao interpretar o objetivo de 1984, que considerava a marca do rompimento de Orwell com o Socialismo e um ataque à esquerda como um todo - talvez Warburg acreditasse que isso deveria ser incluído em A Revolução dos Bichos (39). (imagem abaixo, prédio do Ministério da Verdade, onde se pode ler suas palavras de ordem: guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força, 1984, versão da BBC, 1954)


A essa altura, Joy Batchelor já estava ficando cada vez mais frustrada com a crescente intromissão de todas essas pessoas. Sonia Blair, viúva de Orwell, que tinha autoridade legítima sobre o roteiro, acaba perdendo o interesse em assegurar uma adaptação fidedigna da obra do marido. Em 1952, o esboço do roteiro foi parar na Diretoria de Estratégia Psicológica, que reunia toda a burocracia norte-americana da Segurança Nacional – Departamento de Estado, CIA (que absorveu o Escritório de Coordenação Política em 1951), serviços militares e outras agências governamentais – por trás de uma campanha de guerra psicológica que por pelo menos dois anos investiu grande esforço no combate contra a União Soviética, influenciado opiniões, atitudes, emoções e o comportamento de grupos estrangeiros. Inicialmente a Diretoria considerou a mensagem de A Revolução dos Bichos pouco clara, mas depois de sugerir mudanças percebeu-se que o filme poderia se encaixar numa das linhas de propaganda da Diretoria, que consistia em acusar o regime soviético de ter pervertido o Marxismo – curiosamente, a ênfase da Diretoria na necessidade de veiculação de uma mensagem simples e de fácil compreensão para capturar a audiência não parecer diferir da proposta do Realismo Socialista soviético. De alta prioridade na organização, um Serviço Cinematográfico operava através de 135 postos do Serviço de Informação dos Estados Unidos em 87 países, que em 1952 atingia uma audiência estimada em mais de 300 milhões de espectadores – isso muda completamente a perspectiva da compreensão da verdadeira inundação de filmes norte-americanos na Europa e no resto do “mundo livre” a partir do imediato pós-guerra. Não é difícil perceber o tamanho da sombra que ameaçará cada vez mais, em meios de comunicação de massa como a televisão, os empregos dos “formadores de opinião” que “saírem dos trilhos”. 

“(...) Para o filme ser impactante – e contribuir para a estratégia tripla da Diretoria de Estratégia Psicológica, ‘consolidar, impregnar e libertar’ – a facilidade de compreensão era considerada essencial. Os oficiais da [Diretoria] argumentaram, portanto, que é bem melhor simplificar, presumivelmente até ao custo de modificar o significado de Orwell, ao invés de confundir a plateia em função de uma adesão literal ao texto de Orwell. Em 1952, a colaboração no ativismo político na Europa Ocidental, entre a Diretoria de Estratégia Psicológica e o Escritório de Coordenação Política, significa que havia ampla margem para que o ponto de vista da primeira em relação à Revolução dos Bichos se misturasse com os do grupo de produção” (40) (imagem abaixo, os animais conseguem expulsar Jones, o fazendeiro-capitalista-alcoólatra que escraviza os animais)

Entre o Livro e o Roteiro


O roteiro de A Revolução dos Bichos foi examinado pela Diretoria
 de    Estratégia     Psicológica.     Enquanto    isso,     Fredric   Warburg, 
editor     do     livro     original,    supervisionou     uma     nova    edição
ilustrada com os  desenhos  da  produção de Halas e Batchelor (41)

Com atraso de um ano no cronograma, depois de nove versões do roteiro e muitas alterações significativas do livro por razões de caráter comercial ou artístico, a mensagem de A Revolução dos Bichos é clara. Na opinião de Shaw, a morte do velho Major (Marx-Lênin) imediatamente após seu discurso revolucionário ao invés de vários dias depois cria uma abertura mais dramática. Da mesma forma, a feroz perseguição e assassinato de Bola de Neve (Trotsky) numa cena a um terço do caminho impedem as tentativas dele para derrubar o novo regime enquanto no exílio, mas faz sentido dramático em termos visuais chocantes. Outras mudanças apresentam implicações políticas mais contundentes. Não há dúvida quanto à representação de Napoleão (Stalin) por Orwell como um tirano desprezível, nem da coerência comercial do produtor de Rochemont justificando o desejo de aumentar a natureza autoritária do líder da pocilga. O livro afirma que durante a Batalha do Moinho de Vento (a Segunda Guerra Mundial) todos os animais, menos Napoleão, se esconderam. Para Shaw, a sequência representa Orwell tentando ser justo com Stalin, que continuou em Moscou depois eu Hitler lançou a Operação Barbarossa. No filme, contudo, Napoleão é mostrado como o único animal (com exceção de Squealer, outro porco) que não lutou, dando ordens a partir da segurança da fazenda. Da mesma forma, o livro atribui o comércio entre Napoleão e os humanos parcialmente às necessidades econômicas da União Soviética nos anos 1920 e 1930, enquanto no filme os motivos do líder-tirano são reduzidos à pura ganância (na forma de geleia para si mesmo e os outros porcos) (42). Em carta a Dwight Macdonald (5 de dezembro de 1946), referindo-se ao livro, Orwell expõe seus objetivos sem deixar espaço para dúvidas:

“Quanto à sua pergunta sobre A Revolução dos Bichos. É claro que minha intenção principal era que fosse uma sátira à revolução russa. Mas eu queria que tivesse uma aplicação mais ampla, na medida em que pretendia dizer que aquele tipo de revolução (revolução conspiratória violenta, liderada por pessoas inconscientemente sedentas de poder) só pode conduzir a uma mudança de senhores. Eu queria que a moral fosse que as revoluções somente produzem uma melhoria radical quando as massas estão atentas e sabem como se livrar de seus líderes tão logo eles tenham feito seu trabalho. O momento decisivo da história deveria ser quando os porcos ficam com o leite e as maçãs para si [...]. Se os outros animais tivessem o bom senso de bater o pé naquele momento, então tudo teria ficado bem. Se as pessoas acham que estou defendendo o status quo é porque, penso eu, elas ficaram pessimistas e supõem não haver alternativa exceto a ditadura ou o capitalismo laissez-faire [sem interferência regulatória do governo]. No caso dos trotskistas, há a complicação adicional de que eles se sentem responsáveis pelos eventos na URSS até cerca de 1926 e precisam imaginar que ocorreu uma degeneração súbita em torno dessa data. Ao passo que eu acho que todo o processo era previsível – e foi previsto por algumas pessoas, por exemplo Bertrand Russel – a partir da própria natureza do partido bolchevique. O que eu estava tentando dizer era: ‘Você não pode ter uma revolução a menos que a faça para si mesmo; não existe ditadura benevolente’” (43) (imagem abaixo, momento da pergunta sobre “a verdade dos quatro dedos”, desta vez na versão de 1984 mais interessante para a CIA, realizada em 1956)


Tony Shaw destacou a maneira como o filme trata os personagens humanos, a referência às injustiças do capitalismo e a restrição da liberdade. Pouco se explica em relação à revolta dos animais, enquanto a tirania dos seres humanos se resume na caracterização de Jones como bêbado cruel, e do resto como ralé de botequim. São cortados do filme a tentativa dos humanos de acabar com a rebelião através de propaganda falsa e o castigo nos animais por cantarem o hino da revolução. A canção Sugar Candy Mountain, referência ao cristianismo enquanto defensor servil do status quo, é omitida também. Pilkington e Frederick (as classes governantes inglesa e alemã) são praticamente omitidos. Desta forma, o filme minimiza o significado atribuído no livro às lutas internas ao capitalismo, além da condenação de Orwell à estratégia desonesta da Inglaterra e da Alemanha ao isolar a União Soviética antes da Segunda Guerra Mundial. Tony Shaw conclui chamando atenção para a completa inversão do final do livro na sequência final do filme. O livro conclui com uma nota melancólica, onde os porcos (a corrupção comunista) confraternizam com seus vizinhos fazendeiros (a decadência capitalista), afirmando um interesse comum: manter subservientes os animais inferiores e as classes baixas. Os animais, do lado de fora da janela, olham para porcos e homens sem conseguir distinguir uns dos outros. Orwell está afirmando que não há distinção entre velhos e novos tiranos, sejam capitalistas ou comunistas. Essa confraternização na fazenda pretendia satirizar o primeiro encontro entre Churchill, Roosevelt e Stalin em Teerã, em novembro de 1943, no qual Orwell enxergou futuros conflitos de interesse, devido às implicações da proposta de divisão do mundo em “zonas de influência” (44). Esta é a razão porque, no livro, Pilkington e Napoleão jogam ao mesmo tempo o ás de espadas no final do jogo de cartas (se não podem existir duas cartas iguais, trata-se de fraude). Para Orwell, ao participarem desse conflito no futuro, as massas novamente servem aos interesses de seus opressores. No filme, ao serem retirados os fazendeiros humanos e deixados apenas porcos a chafurdarem nos frutos da exploração, a fusão da corrupção comunista com a decadência capitalista foi desfeita (45).

“O filme muda esse desfecho de duas maneiras. Primeiramente, não é permitido à plateia perceber que fazendeiros capitalistas e porcos comunistas se encontram no mesmo nível degradado. Os fazendeiros são completamente excluídos da cena [sozinho na janela, o asno verá apenas todos os porcos se transformando no bêbado Jones]. Consequentemente, [quando todos os animais atendem ao chamado de rebelião do asno], as criaturas veem apenas porcos se servindo dos frutos da exploração – uma visão que os leva a organizar uma bem sucedida contrarrevolução invadindo a casa da fazenda. Anos mais tarde, John Halas explicou essa virada radical em termos da necessidade do cineasta criar um final positivo, para que a plateia volte para casa feliz. De fato, embora o cenário de revolta apareça nos registros de produção desde março de 1952, a sequência final está na origem de uma disputa que durou seis meses, entre de Rochemont e os diretores, especialmente Batchelor, que desejava ficar com a conclusão do livro. Se os motivos de de Rochemont eram políticos ou comerciais não está claro, mas sua insistência para que os animais contra-atacassem prevaleceu. O resultado não é apenas um final positivo, mas também sublinha a mensagem antissoviética do filme. No contexto da estratégia do governo dos Estados Unidos de ‘libertar’ aqueles que vivem sob o domínio comunista, o tema contrarrevolucionário do filme é particularmente intrigante”  (46) (imagem abaixo, 1984, versão da BBC, 1954)

O Grande Irmão Está Vendo Você


(...) Ironicamente, [...] 1984 passou a ser usado para o mesmo objetivo
contra o qual havia alertado, propaganda para a manutenção do conflito
de  um  super Estado. Seja o que for que Orwell acreditasse estar fazendo,
[...] ‘contribuiu   com   um   dos   mitos   mais  potentes  da  Guerra  Fria... 
Nos  anos  1950,  1984  foi uma maravilhosa novilíngua da OTAN’” (47)

O último romance distópico de Orwell foi mais influente do que A Revolução dos Bichos. Lançado simultaneamente nos Estados Unidos e Grã-Bretanha em 1949, o mundo de terror, invasão psicológica e lavagem cerebral de 1984 logo equipara o adjetivo “orwelliano” a outro já famoso: “kafkiano”. O objetivo do escritor era alertar contra a ameaça do totalitarismo, tanto de esquerda quanto de direita. Contudo, rapidamente os comentadores excluiriam um destes lados. Alguns disseram que a mensagem do livro não é suficientemente clara, e que de nada adiantou quando Orwell escreveu artigos na imprensa tentando explicar o tema. Embora Orwell viesse pensando em 1984 há vários anos, o texto apenas seria escrito entre 1947 e 1949, o que levou muitos a pensar que o escritor se referia a eventos recentes na Europa central e do leste – banido naquela região, o livro circulou ilegalmente nos países comunistas. Alguns comentadores consideraram o livro um veículo para produzir ódio contra a União Soviética, enquanto outros acreditavam seria um antídoto contra a “doença totalitária soviética” ou que Ingsoc representava o Partido Trabalhista inglês – no prefácio que Orwell escreveu para primeira edição de A Revolução dos Bichos, mas que seria publicado apenas em 1972, se ressentiu do patrulhamento ideológico dos intelectuais britânicos, que sistematicamente impediam críticas à União Soviética (48), embora se possa argumentar que no contexto da Segunda Guerra, quando este país era aliado do “mundo livre”, isso poderia atrapalhar a política.  Como mostra a história, 1984 acabou sendo usado como instrumento de propaganda e contribuindo para a mitologia da Guerra Fria e para a manutenção do estado de beligerância generalizada (49). (imagens abaixo, começa a revolta, A Revolução dos Bichos, 1954)


Em setembro de 1953, a primeira adaptação de 1984 para a televisão pela NBC norte-americana tinha uma hora de duração, era bastante próxima do livro e alcançou uma audiência de 8.7 milhão de espectadores. Porém, foi a versão televisionada pela BBC em dezembro de 1954 que ficou famosa. Esse teleteatro (Television Play, Teleplay) com duas horas de duração foi recebido com elogios da crítica por sua interpretação cuidadosa do livro e os esforços para reproduzir a linguagem de Orwell, elogiando também as interpretações de Andrew Morrel como O’Brien e Peter Cushing como Winston Smith – a BBC já havia realizado uma adaptação em 1950, além de haver adaptado A Revolução dos Bichos em 1947 e 1952. De fato, esta adaptação causou frenesi, com os jornais condenando a natureza sádica de certas sequências (ao que parece um espectador morreu de ataque do coração) e o Parlamento debateu a necessidade de censurar esse tipo de programação de televisão. O produtor Rudolph Cartier considerou o livro um aviso contra os totalitarismos de todas as cores, incluindo o Fascismo, Comunismo e Macarthismo. Contudo, a maioria dos membros do Parlamento britânico e os jornalistas consideraram a peça nos termos estritos da Guerra Fria, como uma renuncia da vida atrás da Cortina de Ferro. Este filme lançou Orwell como um escritor “público”, enquanto a linguagem de 1984 entrou na imaginação popular quando, nas palavras de Issac Deutscher (biografo de Stalin) o Teleteatro transformou o livro numa “superarma ideológica” na Guerra Fria das palavras. 

“O desejo de capitalizar em cima do tumulto em torno dessa peça parece constituir o fator principal na decisão de 1955 para fazer uma versão cinematográfica de 1984. Os direitos do filme foram adquiridos do patrimônio familiar de Orwell em 1953 pelo antigo presidente da RKO que virou produtor independente, Peter Rathvon. Durante os anos 1950, Rathvon era um dos principais defensores de ‘filmes internacionais” – filmes financiados por Hollywood, realizados em locações estrangeiras que geravam vantagens fiscais, baixos custos de produção e bilheteria no estrangeiro. Para realizar 1984 nos Associated British’ Elstree Studios, em 1955 Rathvon cria a Holiday Film Productions. Ao contratar um grande elenco anglo-americano e Michael Anderson, diretor de Labaredas do Inferno (The Dam Busters, 1955), a intenção foi se beneficiar financeiramente e politicamente. Durante a investigação da Comissão Congressual para Investigação de Atividades Antiamericanas, Rathvon mostrou pouca simpatia pelos “Dez de Hollywood” na lista negra, incluindo Edward Dmytryk e Adrian Scott, artistas da RKO. Com uma notável carreira empresarial e bancária atrás dele, a postura de Rathvon em relação à Guerra Fria era previsível. No caso de 1984, um subsídio de cem mil dólares da Agência de Informação dos Estados Unidos, a qual possuía controle sobre o roteiro e garantia ao filme exibição mundial, constituía um bônus significativo. O valor de 1984 já era bem conhecido pelos propagandistas [norte-]americanos, tendo sido leitura obrigatória para os oficiais da Diretoria de Estratégia Psicológica em 1952. A intenção era, de acordo com o presidente da Agência de Informação dos Estados Unidos, fazer o filme anticomunista mais devastador de todos os tempos” (50) (imagens abaixo, momentos finais da versão de 1956, quando Winston declara aos gritos seu amor pelo Grande Irmão)

Mil Novecentos e Sei Lá o Que


“Não  acho  que  eu  poderia  ser  descrito  com  um  russófobo. 
Sou contra todas as ditaduras e acho que o mito russo fez um mal
terrível para o movimento de esquerda na Grã-Bretanha e em outros
lugares, e que, acima de tudo,  é necessário fazer as pessoas verem
o regime russo como ele é (ou seja, o que eu penso que ele é) (...)” 

George Orwell,
Carta a Michael Sayers, 11 de dezembro de 1945 (51)

Sol Stein, diretor executivo do Comitê Norte-Americano pela Liberdade Cultura em 1955, mantinha estreito contato com Rathvon e esteve envolvido na produção da versão de 1956 de 1984. Outras atuações do Comitê incluem a adaptação para teatro na Austrália e América Latina do romance do britânico de origem húngara Arthur Koestler baseado nos julgamentos de Moscou durante os expurgos stalinistas na década de 1930, O Zero e o Infinito (Darkness at Noon, 1941) (uma grande inspiração para a edição original em livro de 1984); assim como a promoção de documentários anticomunistas para a televisão em parceria com a Agência de Informação dos Estados Unidos e o desencorajamento à distribuição de filmes com conotações antiamericanas e anticapitalistas – como, por exemplo, O Salário do Medo (Wages of Fear, direção H. G. Clouzot, 1953). O Comitê acreditava que o Ocidente estava perdendo a Guerra Fria cultural naquele período, o que acabou aproximando-o da Campanha para a Liberdade Cultural, de matiz mais conservador. Por solicitação de Rathvon, Stein deu uma série de sugestões para o roteiro de 1984 (quase todas aproveitadas), cujo livro ele acreditava atacar apenas ao “Fascismo Vermelho” – Stein foi membro do Comitê Americano de Amigo das Nações Cativas e, entre 1951 e 1953, atuou como conselheiro ideológico da Voz da América, no Departamento de Estado norte-americano. Deveria existir verossimilhança com o presente histórico (as braçadeiras substituíram as faixas usadas pelos membros da Liga Antissexo no livro; os trompetes que antecediam aos pronunciamentos do regime foram eliminados) e o filme deveria possuir uma aparência de documentário dramatizado. O final também foi modificado, apontando para um desfecho mais otimista do que o escolhido por Orwell (52). (imagem abaixo, outra versão cinematográfica da sequência da tortura em Winston, quando O'Brien lhe pergunta quantos dedos ele está vendo, 1984, versão de 1984, dirigida por Michael Radford)


“Em nosso tempo, discurso e escrita políticos são,
em  grande medida
,  a defesa  do indefensável (...)

George Orwell,
Politics and the English Language, 1945-6 (53)

O Conselho Britânico de Censores de Filmes (a partir de 1985, Conselho Britânico de Classificação de Filmes) atribuiu um certificado “X” para o filme ainda no estágio de roteiro, sem pedir que fossem feitos cortes – a classificação etária “X”, para maiores de 18 anos, havia sido instituída na Inglaterra em 1951. Tony Shaw observou o quanto irônica foi a escolha de Michael Redgrave para o papel de O’Connor, já que o nome do ator figurava na lista de suspeitos cripto-comunistas feita por Orwell no final dos anos 1940 - na versão filmada em 1956, o nome de O’Brien foi trocado para O’Connor; curiosamente, o ator que recebeu o papel de Winston se chama Edmund O’Brien! Estreando em Londres em março de 1956 e nos Estados Unidos seis meses depois, esta versão de 1984 tem muitas simplificações e condensações, embora Shaw sugira que o estilo literário de Orwell criou muitas coisas impossíveis de transfigurar em imagem. Uma série de elementos do livro está presente (os Dois Minutos de ódio, a desilusão de Winston com a vida em Airstrip 1, a tortura e a lavagem cerebral), contudo as mudanças inseridas pela produção são bem aparentes. As bombas atômicas explodindo, representando uma conflagração nuclear em 1965 (Orwell não havia datado). A ênfase na realidade colocou metralhadoras ao invés de armas de laser nas mãos da Polícia do Pensamento, enquanto a parada dos prisioneiros acontecia numa facilmente reconhecível Praça Trafalgar. A intenção era tornar o filme contemporâneo dos espectadores. Uma extensão natural de A Revolução dos Bichos, 1984 mantém a crítica a todos os grandes poderes, cuja rivalidade pode levar à divisão do mundo em três super Estados engajados em guerras sem fim. (imagem abaixo, após ser torturado, e agora aparentemente “livre” de dúvidas, diante da tela Winston declara em voz baixa seu amor pelo Grande Irmão, 1984, versão de 1984, direção Michael Radford)


(...) Muitos intelectuais e escritores britânicos tinham
trabalhado para o governo em seus departamentos de propaganda
durante    a    guerra:     agora,     estavam    sendo    convocados    para
desiludir  o  público  britânico  das  mentiras  que  eles  se  haviam
empenhado   muito   inventivamente   em   proteger”

Frances Stonor Saunders,
Comentário a respeito de um grande problema para os ingleses nos momentos iniciais da Guerra Fria:
como  desconstruir  a  imagem  acolhedora  de  Stalin fabricada pelo o próprio governo britânico? (54)

Alianças como a que existia entre Estados Unidos, Grã Bretanha e União Soviética de 1941 a 1945 mudariam de tempos em tempos, e os verdadeiros perdedores seriam as massas, alimentadas com uma dieta de propaganda e coerção – pode haver ligações entre 1984 e o livro lançado por James Burnham em 1941, The Managerial Revolution, que já falava dessa divisão tripartite, com cada parte liderada por uma oligarquia. Este tema é ofuscado no filme. Oceânia ainda está em guerra com Eurásia, mas ela é atribuída mais aos desejos do Grande Irmão do que ao funcionamento do sistema internacional. Além do mais, Eurásia sempre será o inimigo, ao passo que no final do livro ela subitamente é anunciada como aliada. Também será extirpada a referência de Orwell à natureza falida da Grande Aliança durante a Segunda Guerra Mundial, que originalmente deveria forçar o povo a questionar os motivos de seus líderes. Stein recomendou a Rathvon que os cartazes do Grande Irmão deveriam mostrar a fotografia de um homem (talvez Stalin, então recém-falecido), para enfatizar a possibilidade da existência real do Grande Irmão, mas essa sugestão não vingou e o que se vê é a caricatura de um rosto. A palavra “camaradas” foi mantida como no livro, enquanto a moeda de Oceânia (dólar), que denotaria o imperialismo dos Estados Unidos, foi substituída por libras esterlinas (moeda inglesa). Não aparecem na no filme nenhuma das comparações explícitas entre Ingsoc e os comunistas, que O’Brien faz no livro enquanto procede a uma lavagem cerebral em Winston. Consequentemente, demonstra Shaw, será omitido o importante ponto que o comunismo russo era de fato inferior a Ingsoc em termos de sua habilidade para quebrar a força de vontade de seus oponentes e sua busca final mais por igualdade do que poder. O realce de um julgamento espetáculo ao estilo soviético, com os “traidores” Rutherford e Jones confessando sua culpa antes da execução, altera a mensagem do livro mais uma vez. (imagem abaixo, momento coletivo dos Dois Minutos de ódio, a constatação de que “ignorância é força”, versão de 1984, direção Michael Radford)


(...) [Por   volta   de   1935],   depois   de   dar   uma   boa   olhada
na  pior  face   do   industrialismo   britânico,   ou   seja,  nas  áreas
de  mineração,  cheguei  à  conclusão  de  que  é  um  dever  trabalhar
pelo    socialismo    (...).    Mais    ou    menos   na   mesma   época,    fui
contaminado   por  um  horror  ao  totalitarismo,  que   na  verdade
eu já tinha, sob a forma de hostilidade contra a Igreja católica (...)

George Orwell,
Carta a Richard Usborne, 26 de agosto de 1947 (55)

Tony Shaw acha que Orwell não era inteiramente pessimista. “Se existe esperança” escreve Winston, “ela está com os proles” (as classes baixas insignificantes). Ainda assim, Orwell rejeita a possibilidade de que o espírito humano possa se elevar acima da dor e da privação. Confrontado com os ratos no Quarto 101, um Winston destruído abandona Julia e aprende a amar o Grande Irmão. Considerando perigosamente derrotista a versão de Orwell, Stein acreditava que não era boa no contexto da guerra Fria, o que o levou a criar uma versão alternativa onde Winston prova que seu espírito de liberdade é capaz de sobreviver. Stein recomendou que o filme terminasse com Winston sonhando com outros amantes rebeldes e, contando os dedos, sabendo que dois mais dois são quatro, apesar das torturas de O’Brien. Na versão lançada na Inglaterra, logo que Winston e Julia são solto do Ministério do Amor, vemos que nada pode apagar de suas mentes o conhecimento do caráter maligno do sistema, eles são a prova viva de que nenhum sistema pode destruir a alma humana completamente. Winston grita “abaixo o Grande Irmão” e leva um tiro, juntamente com Julia, que também se sacrifica pela causa da liberdade. A obra prima selvagem de Orwell, concluiu Shaw, será alinhada com a moralidade convencional da tela e a ortodoxia das crenças ocidentais.

“O final do filme lançado nos Estados Unidos corresponde ao livro de Orwell, com Winston e Julia alienados e ambos tendo aprendido a amar o Grande Irmão. Devido à falta de dados de produção, não está inteiramente claro por que foram feitos dois finais com diferentes mensagens. Parece que a BBC solicitou à Columbia Pictures, o distribuidor, para filmar dois finais, um fiel ao romance e o outro mais esperançoso. Este último também se destinava ao mercado [norte-]americano, mais foi trocado apesar dos protestos do diretor (...)” (56) (imagens abaixo, o mundo das telas onipresentes, versão de 1956)


(...) Conheço   o   suficiente   do    imperialismo    britânico
para  não  gostar  dele,   mas   o   apoiaria   contra  o  nazismo
 ou   o    imperialismo    japonês,    por   ser   um   mal   menor. 
Do mesmo modo, apoiaria a URSS contra a Alemanha (...)

George Orwell,
Carta para Noel Willmett, 18 de maio de 1944 (57)

A recepção da versão de 1956 de 1984 não conseguiu corresponder às expectativas, mas Shaw insiste que seria preciso um milagre para fazer esta parábola política de Orwell corresponder ao que está no livro. De qualquer forma, Shaw acredita que a tentativa de Rathvon em explorar a conexão anglo-americana se perdeu, pois o sotaque norte-americano de O’Brien e Redgrave entrou em choque com o de seus colegas britânicos, prejudicando a representação daquela Londres do futuro. A direção de Michael Anderson, Shaw continua, perdeu em inspiração, provavelmente devido à camisa de força imposta a ele pela intenção do produtor de lançar a “mensagem ideológica correta” – é parte do festival de ironias desta história que este tipo de constatação esteja também na base da crítica negativa a muitos filmes produzidos nos países do bloco soviético baseados no Realismo Socialista. A intensa liberdade das cenas de amor não alcançou a tela de cinema, nem mesmo as cenas de tortura (embora Shaw admita que as regras da censura possam ter responsabilidade aqui). Com bilheteria fraca e uma tentativa considerada pobre de misturar gêneros (horror, romance, ficção científica e suspense), além da baixa qualidade e aspecto de baixo orçamento, o filme logo ficaria datado – ao ser retirado de circulação em 1973, essa versão de 1984 já havia caído na obscuridade há muito tempo. Com relação à sequência final, Shaw acredita que deve ter servido aos propagandistas ocidentais, embora sugira como mais apropriado o comentário do Evening Standart em 1 de março de 1956:

“[O livro] é uma denuncia de Nós, assim como Deles. Mas o filme mostra apenas um lado da imagem de Orwell a respeito do futuro. Ele deixou o bastante para fornecer material aos russos para um filme igualmente chocante e poderoso a respeito do Ocidente. Orwell apreciaria a ironia de 1956 revisitando [o livro] para se adequar a seus próprios preconceitos e hipóteses” (58)





Leia também:


Notas:

1. SHAW, Tony. British Cinema and the Cold War. The State, Propaganda and Consensus. London/New York: I. B. Tauris, 2001. P. 114.
2. ORWELL, George. Freedom and Happiness. In: DAVISON, Peter (org.). Orwell and Politics. London: Penguin Books, 2001. Pp. 411-5.
3. SHAW, Tony. op. cit., p. 101.
4. Idem, p. 96.
5. Ibidem, p. 106.
6. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. Tradução Pedro Maia Soares. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. P. 9.
7. _______. Toward European Unity. In: DAVISON, Peter (org.). Op. Cit., p. 478.
8. SAUNDERS, Frances Stonor. Quem Pagou a Conta? A CIA na Guerra Fria da Cultura. Tradução Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Editora Record, 2008. P. 80.
9. SHAW, Tony. op. cit., pp. 91-3, 102-4, 111, 113, 224n17.
10. Idem, p. 113.
11. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. op. cit., p. 250.
12. LEAB, Daniel J. Orwell Subverted: The CIA and the Filming of Animal Farm. Pennsylvania: The Pennsylvania State University Press, 2008. P. 8.
13. ORWELL, George. Why I Write. In: DAVISON, Peter (org.). op. cit., p. 461.
14. SHAW, Tony. op. cit., p. 96.
15. Idem, p. 111.
16. Ibidem, p. 113.
17. Ibidem, p. 114.
18. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., p. 309.
19. SHAW, Tony. op. cit., p. 114.
20. ORWELL, George. Toward European Unity. In: DAVISON, Peter (org.). op. cit., p. 478.
21. _______. Uma Vida em Cartas. op. cit., p. 332n48.
22. SHAW, Tony. op. cit., p. 104.
23. RENTSCHLER, Eric. The Ministry of Illusion. Nazi Cinema and it’s Afterlife. Massachusetts: Harvard University Press, 1996. Pp. 64, 110.
24. Idem, p. 64-5.
25. Brazil: Beyond Citizen Kane. Dirigido por Simon Hartog, produção Large Door Ltd., para Channel 4 da Grã-Bretanha, 1993. Dizem que a BBC também esteve envolvida na produção do documentário.
26. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., p. 312.
27. Entrevista com Florian Henckel von Donnersmarck no DVD de extras do filme A Vida dos Outros, lançado no Brasil pela distribuidora Europa Filmes, 2008.
28. Entrevista com Ulrich Mühe, ver nota anterior.
29. O’BRIEN, Mary-Elizabeth. Post-Wall German Cinema and National History. Utopianism and Dissent. Rochester, New York: Camden House, 2012. P. 135.
30. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., pp. 54-6, 315, 318.
31. SHAW, Tony. op. cit., pp. 93-6.
32. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. op. cit., pp. 254-5.
33. _______. The Lion and the Unicorn: Socialism and the English Genius. In:  DAVISON, Peter (org.). op. cit., p. 104.
34. _______. Unsigned editorial [On defending intellectual decency]. In:  DAVISON, Peter (org.). op. cit., p. 456.
35. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., p. 313.
36. CULL, Nicholas John. Selling War. The British Propaganda Campaign Against American “Neutrality” in World War II. New York/Oxford: Oxford University Press, 1995. Pp. 53-4, 196, 243n30.
37. SHAW, Tony. op. cit., p. 91.
38. Idem, p. 114.
39. Ibidem, pp. 97-9.
40. Ibidem, p. 99.
41. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., p. 319.
42. SHAW, Tony. op. cit., pp. 99-101.
43. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. op. cit., pp. 331-2.
44. Idem, p. 395.
45. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., p. 320.
46. SHAW, Tony. op. cit., p. 101.
47. Idem, p. 105.
48. ORWELL, George. Freedom of the Press. In: DAVISON, Peter (org.). op. cit., pp. 307-9.
49. SHAW, Tony. op. cit., p. 230n95n96.
50. Idem, p. 106.
51. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. op. cit., p. 295.
52. SHAW, Tony. op. cit., pp. 106-13, 231n107n109n117n118.
53. ORWELL, George. Politics and the English Language. . In: DAVISON, Peter (org.). op. cit., p. 406.
54. SAUNDERS, Frances Stonor. op. cit., p. 75.
55. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. op. cit., pp. 13-4.
56. SHAW, Tony. op. cit., p. 231n118.
57. ORWELL, George. Uma Vida em Cartas. op. cit., p. 256.
58. SHAW, Tony. op. cit., pp. 112-3.

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