“O cinema alemão nos anos 60, ou, antes,
o cinema na Alemanha, estava anêmico (...)”
Michel Boujut (1)
Manifesto de Oberhausen
O COLAPSO DO CINEMA CONVENCIONAL ALEMÃO finalmente elimina a base econômica do modo de fazer cinema cuja atitude e prática nós rejeitamos. Com isso, o novo cinema tem chance de nascer (2). (imagem acima, Stroszek, direção Werner Herzog, 1977)
Os curtas-metragens alemães de jovens autores, diretores e produtores receberam recentemente um grande numero de prêmios em festivais internacionais e ganharam reconhecimento de críticos internacionais. Esses trabalhos e sucessos mostram que o futuro do cinema alemão está nas mãos daqueles que têm provado que falam uma nova linguagem cinematográfica.
Tal como em outros países, o curta-metragem se tornou na Alemanha uma escola e base experimental para o longa-metragem.
Declaramos nossa intenção de criar o novo longa-metragem alemão.
Esse novo cinema necessita de novas liberdades. Liberdade em relação às convenções da indústria estabelecida. Liberdade em relação à influência externa de parceiros comerciais. Liberdade em relação ao controle por grupos de interesse especiais.
Temos concepções intelectuais, formais e econômicas, concretas a respeito da produção do novo cinema alemão. Enquanto coletivo, estamos preparados para assumir riscos financeiros.
O velho cinema está morto. Acreditamos no novo.
Oberhausen, 28 de fevereiro, 1962
Bodo Blüthner Walter Krüttner Fritz Schwennicke
Boris v. Borresholm Dieter Lemmel Haro Senft
Christian Doermer Hans Loeper Franz-Josef Spieker
Bernhard Dörries Ronbald Martini Hans Rolf Strobel
Heinz Furchner Hansjürgen Pohland Heinz Tichawsky
Rob Houwer Raimond Ruehl Wolfgang Urchs
Ferdnand Khittl Edgar Reitz Herbert Vesely
Alexander Kluge Peter Schamoni Wolf Wirth
Pitt Koch Detten Schleiermacher
“(...) Os precursores se chamavam
Kluge e Schlöndorff, mas eles
estavam completamente isolados”
estavam completamente isolados”
Wim Wenders (3)
A Indústriazinha
Embora tenha se recusado a assinar o Manifesto, o cineasta alemão Werner Herzog aceitou os 300 000 marcos disponibilizados pelo fundo ministerial Kuratorium para a realização de Sinais de Vida (Lebenszeichen, 1968) (imagens abaixo) – de acordo com Grazia Paganelli, a recusa em assinar o Manifesto foi o primeiro gesto público dele. Na opinião de Herzog, o Manifesto tinha um tom muito próximo da Nouvelle Vague francesa e ele não aprovou os desdobramentos estéticos que essa postura implicava. Além disso, o cineasta admitiu não gostar dos realizadores que assinaram, afirmando que passavam a impressão de serem pessoas medíocres e sem talento procurando imitar a Nouvelle Vague que acabariam sendo esquecidos pela história (4). Lotte Eisner (1896-1983) considerava a obra de Herzog como o carro chefe do Cinema Novo Alemão, ou, pelo menos, o “mais alemão” dentre aqueles que pertencem a esse círculo (5). Eisner chega a se perguntar se chegará o dia em que os alemães não sairão desiludidos após a projeção de um filme alemão. É quando ela cita os “jovens franceses” e os “jovens de Oberhausen”, que quiseram acabar com o “cinema do papai”. Uma renovação, no caso alemão, começa a surgir no Festival de Curtas-Metragens de Oberhausen. Eisner ficou impressionada com o longa-metragem de Herzog, Sinais de Vida, sentindo-se aliviada quando outros se seguiram: “(...) novos filmes de Herzog, Wim Wenders, Fassbinder, [Reinhard] Hauff, [Peter] Fleischmann, Kluge, [Werner] Schroeter, [Herbert] Achternbusch e ainda muitos outros me convenceram de que os jovens alemães haviam ultrapassado as manifestações tão verborrágicas de Oberhausen e estavam aptos a fazer filmes interessantes (...)” (6). (imagem acima, Alexander Kluge na tribuna durante a conferência de imprensa, Manifesto de Oberhausen , 1962 - fonte Kurzfilmtage)
“Era o deserto, uma pequena
indústria deplorável (...)”
indústria deplorável (...)”
Wim Wenders, a respeito da situação
do cinema alemão na década de 1960 (7)
É nesse contexto que deve ser interpretada a enigmática crítica de Herzog à academia? Uma das novidades do Cinema Novo Alemão foi a inauguração de escolas de cinema, embora Herzog costumasse insistir que a academia é a morte do cinema. O cinema não é uma arte para acadêmicos, mas para iletrados (era o que afirmava Herzog ao se incluir entre os últimos); alguma coisa a ver com manter-se longe de condicionamentos que o impediriam de enxergar o mundo de uma forma mais direta – ele chegou a frequentar o curso de cinema nos Estados Unidos, mas abandonou (8); ou talvez, como sugere Chris Wahl, o anti-intelectualismo de Herzog tenha origem nas críticas que acadêmicos alemães fizeram ao dialeto do sul da Bavária usado pelo cineasta (9). De fato, numa entrevista em Nova York em 2008, Herzog aproveitava todas as oportunidades para expressar sua antipatia pela Alemanha e simpatia pela Bavária, a região da Alemanha onde cresceu (10). Na longa discussão em que podemos mergulhar quanto ao legado da barbárie nazista para a sociedade alemã do pós-guerra (e até hoje), as trajetórias de Herzog e Wenders são bastante ilustrativas; o primeiro realizou muitos filmes fora da Alemanha, enquanto o segundo sempre quis fazer carreira nos Estados Unidos.
Voltando a 1962, em seguida ao Manifesto de Oberhausen e graças à subvenção estatal surgem nos festivais europeus os primeiros filmes de baixo orçamento. Alguns deles se destacaram: O Jovem Törless (Der Junge Törless, 1966) (imagens acima), de Schlöndorff (que Eisner elogiou muito, mas disse também que ainda estaria impregnado demais com influências francesas (11)); Es (1966), de Ulrich Schamoni, Anita G. (Abschied von gestern - (Anita G.), 1966), de Kluge; Mahlzeiten (1967), de Edgar Reitz; Tatuagem (Tätowierung, 1967), de Johannes Schaaf; Der Sanfte Lauf (1967), de Haro Senft; Herbst der Gammler ( 1967), de Peter Fleischmann, seguido por seu Cenas de Caça na Baixa Baviera (Jagdszenen aus Niederbayern, 1969), único a conseguir um grande público. Apesar dos variados títulos, Michel Boujut observa que a maioria não se consagrou na própria Alemanha, a exceção ficou com Rote Sonne (1970, direção Rudolf Thome) (imagens abaixo), na época muito elogiado por Wim Wenders em Filmkritik, como “(...) um dos raros filmes europeus que não se contentam em imitar o cinema [norte-]americano” (12).
Vale dizer que com a exceção de Wim Wenders e Schlöndorff, todos aqueles cinemas eram autodidatas, inclusive o próprio Herzog - Fassbinder, por exemplo, sequer chegou a ser aceito no curso de teatro. Wim Wenders, ao contrário de Herzog, saudou a chegada e abraçou a causa do Manifesto, já que em sua opinião o cinema alemão estava em péssima situação. Era uma indústria, mas uma indústriazinha deplorável – até os anos 1960, a produção girava em torno de comédias de aldeia (Heimat film), que foram sucedidas pelos faroestes Winnetou e pornografia leve. Segundo Wenders, não existia mais um cinema alemão que falasse para os alemães. A reputação do cinema alemão no estrangeiro, França e Grã-Bretanha principalmente, foi o que tornou possível a retomada. O cineasta ressaltou que os donos daquela indústria medíocre ficaram ressentidos com a postura do Manifesto e se opunham a esse renascimento, essa máfia que não produzia quase nada se esforçava para barrar a chegada de um novo cinema (13). (imagem abaixo, Fassbinder atuando em Baal, 1970, filme de Schlöndorff para a tv, baseado em peça de Bertold Brecht)
“(...) O roteiro adquire [...] uma estrutura diferente da que
lhe daríamos por livre e espontânea vontade. E o filme
já toma desde o inicio uma direção que impede qualquer
espontaneidade e qualquer subjetividade. O que considero
prejudicial não é que se possa escrever um roteiro, mas que
fatalmente não se escreva roteiros para um filme, mas para
conseguir dinheiro. É uma pequena diferença, mas ela é capital”
Rainer Werner Fassbinder se queixa da Filmverlag der Autoren, criada
justamente como opção contra a máfia que controlava os cinemas (14)
De acordo com Robert Katz, em 1960 os cinemas da Alemanha Ocidental estavam fechando suas portas ao ritmo de um por dia. De um olímpico ano de 1956 com novecentos milhões de ingressos vendidos, a indústria alemã amargou um encolhimento para oitenta milhões em cada um dos quatro anos seguintes. A essa altura, a televisão havia chegado para ficar, ao contrário dos ocupantes norte-americanos, que abandonaram o país conquistado, mas deixaram sua marca. A Guerra Fria pautou os poucos magnatas domésticos que concentravam o poder na indústria cinematográfica alemã no começo da década de 1960, eles fechavam as portas para todos aqueles que não se conformassem aos seus parâmetros – a televisão insípida roubou o público que buscava insipidez no cinema. Foi nesse cenário que os curtas-metragens culturais representaram um espaço de criatividade. Ainda de acordo com Katz, esses jovens cineastas eram financiados por um governo que atirava ossos aos descontentes. Esses filmes ainda ganhavam mais reconhecimento em Nova York, Paris e Londres do que na Alemanha Ocidental, até que no Festival de Curtas-Metragens de Oberhausen a revolta eclodiu, proclamando um novo mundo sobre as cinzas de uma indústria cinematográfica culturalmente falida. Foram necessários três anos para conseguir a formação da agência governamental Kuratorium Junger Deutscher Film, destinada a operacionalizar o Manifesto, financiado os primeiros dois filmes dos novos cineastas da Alemanha Ocidental (15). (imagem abaixo, Cenas de Caça na Baixa Baviera, direção Peter Fleischmann, 1969)
Até 1978, mais de 34 milhões de marcos
haviam sido investidos em co-produções. Os filmes eram
exibidos nos cinemas por dois anos, antes que fossem mostrados
na televisão – o que a tornou responsável por uma
segunda onda do Cinema Novo Alemão (16)
haviam sido investidos em co-produções. Os filmes eram
exibidos nos cinemas por dois anos, antes que fossem mostrados
na televisão – o que a tornou responsável por uma
segunda onda do Cinema Novo Alemão (16)
O Manifesto é mais uma ideia do que um programa preocupado ou organização. Wallace Steadman Watson vai além, tanto no nível federal quanto estadual as autoridades do governo da Alemanha Ocidental estavam comprometidas com o renascimento de uma indústria alemã de cinema respeitável, seja por questões financeiras ou meio de construir uma imagem positiva de uma nova Alemanha no mundo pós-guerra. Contudo, como a comunidade do cinema apontou muitas vezes, o governo nunca investiu tanto quanto o fazia em orquestras sinfônicas, teatros e óperas. Em 1962, é fundado na cidade de Ulm o Instituto do Design de Cinema por vários signatários do Manifesto. Um deles é Alexander Kluge, ele e seus colegas eram comprometidos com a teoria crítica da Escola de Frankfurt, e estavam mais interessados nos efeitos criados pelas perspectivas da câmera do que em narração. A essa altura Herzog e Schlöndorff já haviam realizado seu primeiro longa-metragem e Fassbinder estava pronto para filmar. Novamente nos termos de Katz, “os homens de bom senso do Cinema Novo Alemão” haviam conseguido financiamento do governo para a criação de duas escolas de cinema em 1966 e 1967 – uma em Berlim, Academia Alemã de Cinema e Televisão, a outra em Munique, Escola para Cinema e Televisão. Quem não estivesse convencido de que um filme só prestava se fomentasse a luta de classes era considerado fascista. Em 1966, Fassbinder inscreveu dois curtas em Oberhausen, ambos são recusados - além disso, foi expulso da escola de arte dramática por falta de talento; na verdade, ele nunca conseguiu passar num exame formal em toda a sua vida. (17). Eis a versão de Wim Wenders em suas palavras:
“Nós partimos do zero. Mas nós éramos solitários, cada em busca de sua própria tradição. O ‘Cinema Jovem Alemão’ é uma categoria inventada pela imprensa estrangeira. Não digo que seja uma categoria falsa: ela teve o mérito de nos fazer tomar consciência daquilo que havia de ‘alemão’ em nossos filmes, do que talvez eles tivessem em comum. De qualquer forma, pessoalmente, eu nunca me senti fazendo parte de um movimento, no sentido de um estilo ou tema. Exceto em relação à Filmverlag [der Autoren], uma cooperativa de cineastas que fundamos em 1970 em Munique, com [Hans W.] Geissendörfer, Fassbinder, Brandner e uma dúzia de outros. Era um esforço de solidariedade no plano da produção e da distribuição. A falta de tradição nos deu a coragem, a imprudência e até mesmo a ingenuidade necessárias para esse tipo de aventura. Devo dizer: o país não tinha necessidade de nós. Não havia público para nossos filmes. A Alemanha havia perdido inteiramente a confiança em suas próprias histórias, como havia perdido a fé em sua História” (18)
Numa entrevista de Fassbinder a Wolfram Schütte em fevereiro de 1979 a respeito da situação do cinema na Alemanha Ocidental (intitulada “Na Alemanha só há uma maneira de fazer filmes: sem levar em conta os prejuízos”), pode-se perceber o dilema enfrentado pelos cineastas alemães (19). Wolfram pergunta se Fassbinder ainda pensava como escreveu no roteiro de A Terceira Geração (Die Dritte Generation, 1979) (imagem acima), quando afirmou que havia terminado a época em que os alemães tinham medo de realizar filmes ao mesmo tempo políticos e comerciais comparáveis aos de cineastas italianos como Francesco Rosi Damiano Damiani e o francês André Cayatte. Fassbinder citou A Faca na Cabeça (Messer in Kopf, 1978), de Reinhard Hauf e seu próprio A Terceira Geração como exemplos de que ele não estava tão errado. O que incomodava o cineasta era a exigência de um roteiro prévio para que o investimento fosse aprovado, não bastando um tema ou uma sinopse – algo que ele chamou de “corrida de obstáculos” a ser enfrentada por todos aqueles que pretendem fazer um filme. Ao racionalizar num aquilo que se está sentindo corre-se o risco de esvaziar o sentimento, acredita então que estivesse sendo excessivamente otimista quando escreveu aquilo, explicou Fassbinder. Wolfram respondeu lembrando que na Alemanha Ocidental não havia uma tradição que permitisse algo diferente, ao que Fassbinder reagiu sugerindo criar uma nova tradição, uma nova indústria:
“Pode-se proceder, por exemplo, dizendo: está certo, fizemos o filme [coletivo] A Alemanha no Outono [Deutschland in Herbst, 1978], que deu lucro. E exigimos que este dinheiro sirva para que nós, ou outros cineastas, façamos outros filmes do mesmo gênero. E sem censura prévia. Mas as pessoas da Filmverlag [da qual Fassbinder foi acionista entre 1976 e 1977] logo começaram a censurar, na medida em que diziam: nós somos a Filmverlag, nós é que fizemos A Alemanha no Outono, nós é que permitimos que o filme fosse feito, e, portanto temos de ver bem que outros filmes nos permitiremos fazer. É a mesma forma de censura ou de não-censura das produtoras de televisão” (20)
“Pode-se proceder, por exemplo, dizendo: está certo, fizemos o filme [coletivo] A Alemanha no Outono [Deutschland in Herbst, 1978], que deu lucro. E exigimos que este dinheiro sirva para que nós, ou outros cineastas, façamos outros filmes do mesmo gênero. E sem censura prévia. Mas as pessoas da Filmverlag [da qual Fassbinder foi acionista entre 1976 e 1977] logo começaram a censurar, na medida em que diziam: nós somos a Filmverlag, nós é que fizemos A Alemanha no Outono, nós é que permitimos que o filme fosse feito, e, portanto temos de ver bem que outros filmes nos permitiremos fazer. É a mesma forma de censura ou de não-censura das produtoras de televisão” (20)
Fassbinder concordou com Wolfram que isso tende a ocorrer quando nem mesmo os cineastas acreditam que seus filmes possam fazer sucesso. Wolfram disse ainda que, no caso da Alemanha Ocidental, aquele cinema ao mesmo tempo político e comercial só seria possível em casos isolados, e a Filmverlag era o único co-produtor e distribuidor disponível, já que a televisão bloqueava tudo a não ser que se escreva como ela quer. Fassbinder concluiu dizendo que a única solução é continuar tentando realizar filmes, apesar dele mesmo afirmar que a Filmverlag, em sua opinião originalmente um agrupamento de cineastas debatendo o que é possível fazer e em que condições, logo se transformaria numa associação que só cuida de problemas jurídicos. E por falar em filmes com temas políticos, Fassbinder lembrou como foi complicada a produção de A Terceira Geração, seu filme a respeito do terrorismo do grupo Baader-Meinhof. Ele desejava realizar o filme em Berlim, com subvenção do Senado da cidade e participação financeira da rede pública de televisão da antiga Alemanha Ocidental (WDR - Westdeutscher Rundfunk), mas esta última voltou atrás em sua decisão por razões políticas, o Senado fez o mesmo quando soube qual era o tema, seguido do chefe de polícia de Berlim. Mas quando isso aconteceu Fassbinder já estava na primeira semana de filmagens, a única mudança foi o aumento da dívida do cineasta em 300 000 marcos. (imagens abaixo, Alemanha no Outono)
Cultura do Subsídio e Autor Independente
O financiamento do Kuratorium para novos filmes seria bastante
reduzido em 1968, em função de um complicado processo onde os
jovens cineastas foram “passados para trás pela velha guarda” (21)
Em seu livro lançado em 1989, porém escrito antes da queda do Muro de Berlim naquele ano, Thomas Elsaesser se batia contra aquilo que considera dois lugares-comuns a respeito da história do cinema alemão que se tornaram uma crença generalizada. A primeira é que a origem do Cinema Novo Alemão remonta ao Manifesto de Oberhausen em 1962. Ou ainda, de que exista uma continuidade entre os filmes que se seguiram a Oberhausen e os trabalhos de Rainer Werner Fassbinder, Wim Wenders e Werner Herzog que deram uma identidade ao Cinema Novo Alemão. De acordo com Elsaesser, Oberhausen pertence tanto à década de 1950 quanto à de 1970. Para ele, é preciso distinguir entre o Cinema Jovem Alemão e o Cinema Novo Alemão em termos de política de produção cinematográfica, assim como de estilo e tema. O que une os dois, pelo menos superficialmente, ainda segundo Elsaesser, é uma plataforma militante em torno do conceito de cinema de autor (Autorenfilm). Contundo, novamente, Elsaesser avisa que a conclusão não é simples, dada a natureza contraditória deste conceito. A segunda crença afirma que o Cinema Novo Alemão ataca o cinema e os cineastas que vieram antes, produzindo espontaneamente uma inovadora visão pessoal. O que se pode perceber é que cineastas como Fassbinder, Wenders, Hans-Jürgen Syberberg e Volker von Schlöndorff apresentam uma abordagem comprovadamente complexa em relação a seus antepassados, à Hollywood, ao cinema comercial alemão e ao cinema de arte europeu (22).
“De fato, o conceito de cinema de autor possui uma função primária estratégica. [Em meu livro procuro contextualizar a auto-imagem heróica dos cineastas ao mostrar como os] diretores-estrelas eram parte de um movimento amplo dentro da Alemanha para conquistar novas platéias e também representar um trunfo exclusivo de marketing internacional. Tal concepção não implica que os heróis devam ser derrubados de seus pedestais – embora a imagem de uma luta solitária e perseguida, ou mesmo coletiva e triunfante, deva ser vista pelo que ela é: um discurso, uma posição, uma ficção necessária para permitir e motivar produtividade. Mais importante ainda, exige que se veja o subsídio direto e indireto do governo – a principal razão econômica para o florescimento da produção cinematográfica na [antiga] Alemanha Ocidental durante a década de 1970 – num contexto mais amplo do que aquele do Estado apoiando artistas de gênio. Ao invés disso, o subsídio se tornou parte da política de cultura, onde o cinema independente é um enclave protegido, indicativo de um desejo de criar e preservar uma ecologia de cinema e mídia no meio de uma economia internacional de cinema, mídia e informação em constante expansão” (23)
A maioria dos 26 escritores e artistas que assinaram o Manifesto de Oberhausen acumulou experiência com cinema através de curtas-metragens subsidiados – seja pelo Ministério do Interior, companhias de petróleo ou a indústria química. Enquanto grupo, sua influência nos círculos do governo da antiga Alemanha Ocidental foi considerável. Para Elsaesser, o aspecto mais inovador do Manifesto foi uma união de pessoas com ideias distintas em torno de uma plataforma comum. O resultado mais tangível foi Kuratorium Junger Deutscher Film, criado em 1967, que deveria colocar o Manifesto em prática e acabou por ser encarado como uma ameaça pela indústria de cinema. Após anos de debate público, essa pressão entre o lobby do Kuratorium e o lobby comercial, o Parlamento instituiu um sistema de distribuição de verbas a partir da arrecadação de uma fração de cada ingresso de cinema vendido na Alemanha Ocidental. Contudo, a agência governamental encarregada só distribuía o dinheiro para produtores consagrados, o que foi um golpe para o Cinema Jovem Alemão - “passados para trás pela velha guarda”, nos anos seguintes, a solução encontrada foi financiar apenas aqueles que alcançassem classificações como “valioso” ou “extremamente valioso” (24). Na prática, o subsídio (que deixou de ser da responsabilidade do governo federal e passou para os Estados) foi concebido principalmente como um bônus de produção comercial (que, atrelado à necessidade da apresentação de um distribuidor, asfixiava a produção que não se adequasse ao padrão de filme esperado). Enquanto contra-ataque ao Manifesto de Oberhausen, essa “jogada” levou a uma debandada dos cineastas independentes em busca de oportunidades na televisão comercial e apressou a dissolução do grupo original de Oberhausen. (imagem abaixo, Na Floresta. Depois das Cinco, Nach Fünf im Urwald, direção Hans-Christian Schmid, 1995)
“Uma consequência da iniciativa de Oberhausen foi
chamar atenção para o problema da formação e da educação. Em 1962
Kluge, Reitz e Detten Schleiermacher criaram a primeira escola de
cinema da Alemanha Ocidental. O Institut für Filmgestaltung Ulm,
para o qual esperavam recrutar Fritz Lang (...)” (25)
chamar atenção para o problema da formação e da educação. Em 1962
Kluge, Reitz e Detten Schleiermacher criaram a primeira escola de
cinema da Alemanha Ocidental. O Institut für Filmgestaltung Ulm,
para o qual esperavam recrutar Fritz Lang (...)” (25)
Elsaesser mostra como tudo isso acabou sendo desastroso para a indústria de cinema como um todo na Alemanha, pois levou a busca do lucro rápido com pornografia, levando inclusive ao fechamento de muitas salas de cinema fora das grandes cidades. Resultando, comprometimento do futuro da indústria do cinema ao juntar o aumento da produção (ancorada nos gostos erráticos e pouco previsíveis do público de pornografia) com um mercado que encolhia a cada dia (o que já havia ocorrido nos anos de 1950). Donos de salas de cinema interessados em projetar filmes mais “nobres” eram obrigados a se render à pornografia para fazer algum dinheiro. Essa imposição dos distribuidores sufocou aqueles cinemas que não trabalhavam com estréias (second-run cinemas), situação que foi retratada por Wim Wenders em No Decurso do Tempo (Im Lauf der Zeit, 1976), onde uma mulher preferia fechar seu cinema mostrar obscenidades. O Manifesto de Oberhausen foi apenas uma numa longa série de panfletos e pronunciamentos lamentando a situação do cinema alemão, embora tenha gerado interesse na formação dos cineastas – de todos os cineastas alemães daquela época com renome internacional, apenas Volker Schlöndorff e Wim Wenders eram formados em cinema; Fassbinder, por exemplo, foi recusado quando se candidatou em Berlim. O Kuratorium, que em tese deveria funcionar através do sistema financeiro de fundo rotativo, para cineastas iniciantes, na prática raramente exigiu o dinheiro de volta. Aqui o filme era visto como uma obra de arte e um ato de auto-expressão cujo valor estava no simples fato de existir, apenas secundariamente na possibilidade de circular como mercadoria.
“A esse respeito, o Cinema Jovem Alemão era distinto de outros cinemas de arte comparáveis tais como a Nouvelle Vague na França, cujos filmes funcionavam como produtos alternativos, mas no interior de uma indústria cinematográfica mais ou menos tradicional, que compreendia tanto estabelecimentos comerciais quanto cinemas de arte. Eles poderiam ser direcionados a platéias estratificadas, contudo cinematograficamente alfabetizadas. Em contrapartida, os filmes do Cinema Jovem Alemão eram realizados com um sentimento muito menos garantido de uma platéia real, e muitas vezes faziam poucas referências explícitas ou implícitas à cultura cinematográfica nacional ou internacional. Os primeiros filmes de Syberberg ou Herzog, por exemplo, foram a um grau notável objetos sui generis, à margem de qualquer tradição reconhecível de produção cinematográfica, seja comercial ou de vanguarda. Os ensaios de Kluge em celulóide, e mesmo os filmes de Jean-Marie Straub ou Vlado Kristl [os dois últimos não pertencem ao grupo de Oberhausen] davam a impressão de ser, em contraste com o amor dos diretores franceses pelo cinema, inspirados pelo que se poderia quase chamar ‘cinefobia’, uma repulsa contra a indústria do cinema comercial e seu produto padrão, o filme de narrativa ficcional” (26) (imagem abaixo Lichter, direção Hans-Christian Schimd, 2003)
Para Elsaesser, o Manifesto era claramente dirigido ao governo da ex-Alemanha Ocidental em seu papel autonomeado papel de representar não apenas as tradições liberal-democráticas do país, mas defender a liberdade de expressão, de opinião, de movimento e de comércio contra as reivindicações da rival do outro lado da fronteira: a tradição socialista anti-burguesa representada pela ex-Alemanha Oriental, a República Democrática Alemã. Mas repetir as palavras da constituição de uma democracia liberal serve apenas para evidenciar as discrepâncias entre ideologia e prática, assim como as contradições do modelo. As firmas internacionais controlam o mercado, e o autor-produtor e/ou independente não pode fazer nada. Resta aos cineastas se organizarem em conjunto e deixarem de se iludir a respeito de sua “liberdade”. Segundo Elsaesser, foi para cobrir sua própria lacuna de legitimação que o governo da Alemanha Ocidental levou adiante a política de financiamento e saudou a chegada do Manifesto de Oberhausen. O governo alemão ocidental utilizou a alta cultura para promover consenso e fomentar a coesão social, ou pelo menos se pode dizer que essa foi uma de suas tentativas para preencher o vácuo deixado pelo colapso da República de Weimar e pelo Estado Nazista, sem falar nas divisões sociais e de classe exacerbadas pela divisão da Alemanha em dois Estados soberanos. (imagem abaixo, Corra, Lola, Corra, direção Tom Tykwer, 1998)
Em relação ao público intelectualizado,
a política de subsídios também criou problemas
para a legitimação do cinema, uma situação que o
cinema alemão já amargava desde os primórdios
do período silencioso no começo do século XX
a política de subsídios também criou problemas
para a legitimação do cinema, uma situação que o
cinema alemão já amargava desde os primórdios
do período silencioso no começo do século XX
Falar em “cinema nacional” ao invés de “indústria doméstica do cinema” também era conveniente para a República Federal (a Alemanha Ocidental) porque um de seus dogmas era se apresentar como a única e legítima representante da cultura e história germânicas. O cinema era, insistiu Elsaesser, uma forma particularmente efetiva de afirmar a causa da Alemanha Ocidental, em oposição à afirmação rival que vinha da República Democrática Alemã (a Alemanha Oriental). No começo dos anos 1950, durante a descartelização da UFA [Universum Film Aktiengesellschaft, estúdio fundado em 1917 pelos militares, até que os nazistas o utilizaram para monopolizar a indústria do cinema], pretendia-se “exportar, por assim dizer, cultura, civilização e prestígio alemão através dos filmes alemães – não apenas para o exterior, mas também para levar ao cinema alemão em casa uma nova auto-estima” (27). De acordo com Elsaesser, o impulso para legitimar a Alemanha Ocidental dessa forma parece ter sido muito bem sucedido, como o rótulo “Cinema Novo Alemão” prova: quem insistiria em especificar Cinema Novo Alemão “Ocidental”? Referindo-se o tempo todo especificamente ao caso alemão, Elsaesser afirma que o sistema de subsídios protegeu os cineastas de um mercado que nunca os teria deixado existir, mas condenando-os a uma legitimação cultural que para existir depende de estar parcialmente fora da circulação do capital.
“(...) Precisa ficar de olhos abertos, se quiser continuar sendo o que é:
um artista sério, que faz suas experiências com dor para poder criar
obras que, quem sabe, superem a dor. Quem só quer vender no fim
vende-se a si mesmo, porque com isso perde a capacidade
de ver e ouvir. E alguém assim, segundo o pensamento
do próprio Wenders, já não seria um homem sério” (29)
um artista sério, que faz suas experiências com dor para poder criar
obras que, quem sabe, superem a dor. Quem só quer vender no fim
vende-se a si mesmo, porque com isso perde a capacidade
de ver e ouvir. E alguém assim, segundo o pensamento
do próprio Wenders, já não seria um homem sério” (29)
A Filmverlag só estava interessada em utilizar os ganhos com Paris, Texas para cobrir parte das perdas com a saída do acionista majoritário, Rudolf Augstein. Fracassa um acordo que permitisse a exploração do filme pela Tobis-Filmkunst, enquanto a Filmverlag tenta exibir uma cópia não autorizada (além de mutilada e escura) para a imprensa. Naquela tarde, Wenders, Uwe Brandner e Hans W. Geissendörfer estão dispostos a abrir mão de suas cotas na Filmverlag, deixando a empresa dos autores quase sem autores. “(...)’Por uma bagatela’, como diz Wenders num programa de TV, Paris, Texas chega finalmente, a 11 de janeiro de 85, às salas de exibição, no país onde o cinema após a Segunda Guerra Mundial conheceu o desenvolvimento mais admirável na Europa, depois do neorrealismo italiano e da Nouvelle Vague francesa, mas que infelizmente nunca soube recepcionar sua arte contemporânea com orgulho e dignidade” (30). Na opinião de Buchka, em O Amigo Americano (Die Amerikanische Freund, 1977) Wenders já apresentava seu próprio dilema enquanto autor que se quer independente (status ao qual se agarra), mas que sempre procura estar ligado à pátria (às vezes em seu prejuízo). Para continuar assim, só lhe resta sobreviver dos nichos da indústria cinematográfica internacional, ainda assim prestes a perder sua independência a cada momento. Quem só quer vender, no fim vende-se a si mesmo, perdendo a capacidade de ver e ouvir, concluiu Buchka.
“O fato é que a insolúvel contradição entre criatividade e comércio a muito se deslocou para o núcleo mais íntimo da produção artística. No fundo, O Amigo Americano já começa com esse problema: ‘Você não é um homem sério’, diz o pintor Derwatt a Ripley, que vende seus quadros de forma um tanto obscura. ‘Isto aqui’, defende-se Ripley, enquanto segura um maço de notas no nariz de Derwatt, ‘não é sério o suficiente? São 2 mil dólares para você. Eu tenho um olho para essas coisas’. O próprio Derwatt bem que gostaria de pintar e vender mais. Só que um artista não tem olhos para ganhar dinheiro, mas para ter do mundo uma visão precisa e nova. É por isso que a Ripley, que quer especular com quadros como se fossem ações, Derwatt só tem sarcasmo a dispensar: ‘Tome cuidado. Olhos não se compram’” (31) (imagem abaixo, A Música e o Silêncio, Jenseits der Stille, direção Caroline Link, 1996)
“O fato é que a insolúvel contradição entre criatividade e comércio a muito se deslocou para o núcleo mais íntimo da produção artística. No fundo, O Amigo Americano já começa com esse problema: ‘Você não é um homem sério’, diz o pintor Derwatt a Ripley, que vende seus quadros de forma um tanto obscura. ‘Isto aqui’, defende-se Ripley, enquanto segura um maço de notas no nariz de Derwatt, ‘não é sério o suficiente? São 2 mil dólares para você. Eu tenho um olho para essas coisas’. O próprio Derwatt bem que gostaria de pintar e vender mais. Só que um artista não tem olhos para ganhar dinheiro, mas para ter do mundo uma visão precisa e nova. É por isso que a Ripley, que quer especular com quadros como se fossem ações, Derwatt só tem sarcasmo a dispensar: ‘Tome cuidado. Olhos não se compram’” (31) (imagem abaixo, A Música e o Silêncio, Jenseits der Stille, direção Caroline Link, 1996)
Apesar da ênfase num “cinema do consenso”, a produção
direcionada para a TV alemã durante a década de 1990 aponta muitas
exceções a essa regra – lembrando as oportunidades oferecidas
pela TV durante a década de 1970 ao Cinema Novo Alemão
direcionada para a TV alemã durante a década de 1990 aponta muitas
exceções a essa regra – lembrando as oportunidades oferecidas
pela TV durante a década de 1970 ao Cinema Novo Alemão
Em 1989 cai o Muro de Berlim e muita coisa muda na Alemanha agora reunificada. Contudo, no que diz respeito à indústria cinematográfica os anos 90 do século passado, nem todo mundo aprovou a capacidade da nova geração de cineastas em produzir filmes comercialmente viáveis em alemão e mais ligados ao modelo hollywoodiano do que à tradição do filme de arte europeu. O próprio status de autor também sai de cena, dando lugar à ênfase no trabalho de equipe. Críticos como Eric Rentschler, Georg Seeßlen e Fernand Jung tendem a lamentar essa tendência comercial. Quando comparados às conquistas do Cinema Novo Alemão, os três críticos se referiram à geração dos anos 90 como produtora apenas de filmes convencionais sem qualquer impulso crítico – especialmente se comparados a produções como Alemanha no Outono. Outra tendência, diametralmente oposta, aplaude os cineastas dos anos 90 e fala de um legado de cinema popular alemão capaz de produzir entretenimento de qualidade, chamando atenção tanto do público quanto de distribuidores estrangeiros. Enquanto os cineastas do Cinema Novo Alemão lutaram se tornarem financeiramente independentes da “indústria cinematográfica comercial” (desenvolvendo os estilos pessoais que caracterizam o “cinema de autor”), a década de 1990 foi dominada por um “cinema da afluência” (interesse pelo cinema comercial e ênfase na competência técnica) - que Hans-Günther Pflaum e Hans Helmut Prinzler já haviam identificado nos jovens cineastas dos anos 1980. David Clarke cita como representativos dessa tendência comédias de relacionamento como Stadtgespräch (direção Rainer Kaufmann, 1995) e Mulheres (Abgeschminkt!, direção Katja Von Garnier, 1993), mas também em produções mais recentes como Mondscheintarif (direção Thomas Huettner, 2000) e filmes sobre as aflições dos jovens de classe média, como A Música e o Silêncio (Jenseits der Stille, direção Caroline Link, 1996) (32). (imagem abaixo Crazy)
Clarke mostrou que muitos jovens cineastas agarraram a chance
de trabalhar num contexto comercial, como Hans-Christian Schmid -
com filmes para e sobre jovens como Na Floresta. Depois das Cinco
(Nach Fünf im Urwald, 1995) e Crazy (2000); Lichter (2003)
examina a luta de imigrantes ilegais, delinquentes e
empresários falidos - e Esther Gronenborn - com Alaska.de (2000)
de trabalhar num contexto comercial, como Hans-Christian Schmid -
com filmes para e sobre jovens como Na Floresta. Depois das Cinco
(Nach Fünf im Urwald, 1995) e Crazy (2000); Lichter (2003)
examina a luta de imigrantes ilegais, delinquentes e
empresários falidos - e Esther Gronenborn - com Alaska.de (2000)
Rentschler se referiu a essa tendência como “cinema de consenso”, onde a mudança do status quo não é mais a meta dos cineastas – mesmo a considerando desejável ou possível. De fato, o financiamento estatal na República Federal da Alemanha nunca esteve inteiramente divorciado de considerações comerciais. Contudo, esclareceu Clarke, a partir da chegada ao poder da coalizão entre os liberais e os Democrata-Cristãos de Helmut Kohl em 1982 os políticos responsáveis pela indústria cinematográfica insistiram na necessidade de um cinema de entretenimento popular (portanto consensual), em detrimento de um cinema elitista (e crítico) de arte. Essa tendência se refletiria desde então na política de financiamento, sem falar no surgimento em meados dos anos 1980 dos canais de televisão a cabo como ProSieben, Sat.1 e RTL, que produziam seus próprios filmes. Além disso, nos anos 1990, o renovado interesse de Hollywood no financiamento de filmes caseiros alemães produziu uma dramática transição, passando do modelo de subsídio governamental (que era livre da ansiedade em relação ao lucro e ao apelo comercial) para o domínio do interesse privado e do grande capital. Contudo Clarke é um pouco dúbio ao sugerir que os trabalhos de jovens cineastas como Hans-Christian Schmid e Esther Gronenborn mostram que o muro entre cinema comercial e cinema de autor talvez esteja começando a desmoronar, ainda que a opção pelo primeiro possa levar ao risco de nunca se conseguir realizar um trabalho mais pessoal e crítico (caso exista esta ambição). (imagem abaixo, Lichter)
Tom Tykwer fundou a produtora independente X-Filme Creative Pool,
juntamente com o produtor Stefan Arndt e os cineastas Wolfgang Becker e Dani Levy que segue o modelo da United Artists nos Estados Unidos
juntamente com o produtor Stefan Arndt e os cineastas Wolfgang Becker e Dani Levy que segue o modelo da United Artists nos Estados Unidos
Os comentários de David Clarke foram escritos em 2006, ele afirmou que até aquele momento um cineasta como Tom Tykwer foi capaz de desgastar ainda mais a divisão entre cinema autoral (Autorenfilm) e cinema comercial. Seu incrivelmente bem sucedido Lola, Corra, Lola (Lola Rennt, 1998) deve ser entendido sugeriu Clarke, no contexto de uma carreira que produziu filmes idiossincráticos e não convencionais, como Die Tödliche Maria (1993), Winter Sleepers - Inverno Quente (Winterschläfer, 1997), releitura pós-moderna dos filmes de montanha (Bergfilm) e Paraíso (Heaven, 2002), baseado em roteiro do polonês Krzysztof Kieślowski e Krzysztof Piesiewicz. Cofundador da produtora X-Filme, seu objetivo é somar forças para torna-se mais forte e criar uma plataforma diversificada de ideias. “(...) O objetivo dessa companhia é triplo: primeiramente, aprimorar a relação de trabalho entre produtores, roteiristas e cineastas ao integrá-los numa estrutura cooperativa ao mesmo tempo crítica e solidária; em segundo lugar, assumir riscos e produzir filmes alemães exigentes, individuais, porém de entretenimento, que atingirão um público significativo; e, em terceiro lugar, aumentar o controle dos artistas sobre o filme pronto. Semelhante à Filmverlag der Autoren (...), porém com uma sensibilidade mais comercial, a X-Filme busca preencher a lacuna entre o cinema comercial e o cinema inteligente e original (...)” (33).
Leia também:
Herzog, Fassbinder e seus Heróis Desesperados
As Mulheres de R. W. Fassbinder (I), (II), (III), (IV), (V), (VI), (VII), (VIII), (IX), (X), (XI)
As Mulheres de R. W. Fassbinder (I), (II), (III), (IV), (V), (VI), (VII), (VIII), (IX), (X), (XI)
Notas:
1. BOUJUT, Michel. Wim Wenders. Une Voyage Dans ses Films. Paris: Flammarion, 1986. P. 23.
1. BOUJUT, Michel. Wim Wenders. Une Voyage Dans ses Films. Paris: Flammarion, 1986. P. 23.
2. FOWLER, Catherine (Ed.). The European Cinema Reader. London: Routledge, 2002. P. 73.
3. BOUJUT, M. Op. Cit., p. 24.
4. PAGANELLI, Grazia. Sinais de Vida. Werner Herzog e o Cinema. Tradução Marta Amaral. Lisboa: Edições 70/Indie Lisboa, 2009. Pp. 11, 18n3, 26.
5. NAGIB, Lúcia. Werner Herzog: o Cinema Como Realidade. São Paulo: Estação Liberdade, 1991. Pp. 60, 129.
6. EISNER, Lotte H. A Tela Demoníaca. As Influências de Max Reinhardt e do Expressionismo. Tradução Lúcia Nagib. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. Pp. 234-5.
7. BOUJUT, Michel. Op. Cit., p. 23.
8. PAGANELLI, G. Op. Cit., pp. 17-8.
9. WAHL, Chris. “I don’t like the Germans”, Even Herzog Started in Bavaria. In: PRAGER, Brad (Ed.). A Companion to Werner Herzog. Blackwell Publishing Ltd, 2012. P. 240.
10. Idem, p. 233.
11. EISNER, L. H. Op. Cit., p. 234.
12. BOUJUT, M. Op. Cit., p. 26.
13. Idem, pp. 23, 24.
14. FASSBINDER, Rainer Werner. A Anarquia da Fantasia. Ensaios, anotações de trabalho, conversas e entrevistas. Tradução Sonia Baldessarini e Clóvis Marques. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1988. P. 121. Ver também: FASSBINDER, R. W. La Anarquia de la Imaginación. Entrevistas, ensayos y notas. Barcelona: Ediciones Paidós, 2002. Pp. 169-183.
15. WATSON, Wallace Steadman. Understanding Rainer Werner Fassbinder: Film as Private and Public Art. USA: University of South Carolina Press, 1996. P. 30-1.
16. Idem, pp. 32, 39n87.
17. KATZ, Robert; BERLING, Peter. O Amor é Mais Frio do que a Morte. A Vida e o Tempo de Rainer Werner Fassbinder. Tradução Carlos Sussekind. São Paulo: Editora Brasiliense, 1992. Pp. 41-2, 45, 47.
18. BOUJUT, M. Op. Cit., pp. 24-5.
19. FASSBINDER, R. W. Op. Cit., pp. 119-20, 122, 124, 126.
20. Idem, p. 121.
21. WATSON, W. S. Op. Cit., p. 32.
22. ELSAESSER, Thomas. New German Cinema. London: MacMillan, 1989. Pp. 2, 20-5, 27, 46-7, 102.
23. Idem, pp. 2-3.
24. WATSON, W. S. Op. Cit., p. 32.
25. ELSAESSER, T. Op. Cit., p. 27.
26. Idem, pp. 24-5, 77.
27. Ibidem, p. 47.
28. BUCHKA, Peter. Olhos não se Compram: Wim Wenders e seus Filmes. Tradução Lúcia Nagib. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. Pp. 23-5.
29. Idem, p. 25.
30. Ibidem, p. 24.
31. Ibidem, p. 25.
32. CLARKE, David (Ed.). German Cinema Since Unification. London/New York: Continuum, 2006. Pp. 1-9.
33. Idem, p. 4-5.