“Para fazer filmes, a melhor maneira é assisti-los”
Frase muito pronunciada pelos
cineastas da Nouvelle Vague
Muitos cineastas ligados ao fenômeno da Nouvelle Vague admitem a influência Roberto Rossellini e do Neo-Realismo sobre eles. Cineasta italiano e pai do Movimento Neo-Realista no cinema de seu país a partir do final da Segunda Guerra Mundial, Rossellini disse certa vez: “A Nouvelle Vague, contrariamente ao Neo-Realismo, não trouxe nenhuma filosofia ou estética nova. Trouxe somente uma mudança nos métodos de produção” (1). Aldo Tassone afirma que só se pode falar de uma autêntica revolução estética em relação ao cinema francês dos anos trinta do século vinte e para o Neo-Realismo italiano. (2)
Ao contrário do Neo-Realismo na Itália, que havia surgido em função de mostrar a situação social e política do país a partir do final da Segunda Guerra Mundial, a Nouvelle Vague não se preocupou em abordar a situação política na França e a guerra sádica que eles travavam na Argélia. François Truffaut, um dos principais membros da Nouvelle Vague, fortemente influenciado pelo trabalho de Rossellini, admitiu que já a partir de seu segundo filme (Atirem no Pianista, 1960) ele pretendia se afastar dessa influência.
O cineasta francês Claude Lelouch era contemporâneo do grupo, embora afirmasse que não se identificava com ele. Na opinião de Lelouch, a Nouvelle Vague não foi uma revolução. Pelo menos não dos cineastas, mas dos operadores de câmera. Disse também que todos os fundadores da Nouvelle Vague fizeram filmes piores do que aqueles dos cineastas que eles “massacraram” (como Clouzout, Autant-Lara, Clément e Duvivier). Segundo Lelouch, esse grupo da nova onda estava mais próximo de um romancista do que de um cineasta. “Eu penso que o grande defeito da Nouvelle Vague foi ter complicado coisas simples”.(...)” ’Era uma ditadura, o gulag; o número de cineastas que eles exterminaram’ é incrível” (3). Na Itália, por outro lado, não havia essa tendência dos filhos (Rosi, Pasolini, os irmãos Taviani, Olmi...) matarem os pais (Rossellini, Visconti, De Sica). Pelo contrário, a velha guarda e a nova onda uniram as forças. (4)
Enquanto os cineastas franceses da época escreviam em jornais, Lelouch era operador de câmera. Como afirmou, se houve uma revolução chamada Nouvelle Vague, essa foi levada a cabo por operadores de câmera, por cameramen (5). Fala-se muito dos cineastas da Nouvelle Vague, mas ninguém é informado dos muitos avanços técnicos, novas câmeras, novas películas! Tudo isso permitiu que os cameramen (e os cineastas) pudessem sair do estúdio e filmar nas ruas (6). A frase definitiva de Lelouch: “é uma revolução de operadores de câmera, a Nouvelle Vague é Kodak” (7). Seja como for, se Lelouch tivesse que escolher os cineastas da Nouvelle Vague que mais aprecia, apontaria François Truffaut e Jean-Luc Godard – embora veja no último mais um escritor de diálogos do que um cineasta. Não reconhece Alain Resnais como pertencente ao grupo. Considera-o o cineasta francês mais importante do pós-guerra. (8)
Resnais concorda que, se houve uma revolução, foi mais no campo dos operadores de câmera (9). Entretanto, o cineasta relembra que a Nouvelle Vague não fez tabula rasa dos quarenta anos de cinema que a precederam. Não, eles não queriam queimar todos os filmes anteriores e partir do zero. A prova é que eles eram cinéfilos, eles freqüentavam cinemas e cinematecas. Diziam que para fazer filmes a melhor maneira era assisti-los. Para Resnais, o grupo promovia um retorno aos anos vinte e trinta do século passado. Também não acredita que se possa afirmar que existiu uma estética comum entre aqueles cineastas. O que havia em comum era uma paixão por filmes. Conclui Aldo Tassone:
“Uma revolução estética? Contrariamente àquilo que se continua a escrever, a Nouvelle Vague foi uma revolução na técnica e na produção, mas não uma ‘revolução estética’, não cessam de repetir entre outros, Truffaut, Rohmer, Chabrol, Demy, Malle, Kast, Robbe-Grillet, Karmitz, Miller, Schroeder, Thomas...” (10)
Notas:
Leia também:
As Mulheres de Luis Buñuel
Luis Buñuel, Incurável Indiscreto
Kieslowski e o Outro Mundo
1. TASSONE, Aldo. Que Reste-t-il de la Nouvelle Vague? Paris: Éditions Stock, 2003. P. 252.
2. Idem, p. 13.
3. Ibidem, p. 173.
4. Ibidem, p. 12.
5. Ibidem, p. 177.
6. Ibidem, pp. 177 e 229.
7. Ibidem, p. 13.
8. Ibidem, p. 178.
9. Ibidem, p. 229.
10. Ibidem, pp. 12-13.